Se em “Pai em Dose Dupla” Sean Anders aposta na improvável química entre Will Ferrell e Mark Wahlberg, em “Pai em Dose Dupla 2” o diretor está longe de querer abrir mão de sua galinha dos ovos de ouro, mas agarra com toda a força que pode a oportunidade de colocar em cena dois medalhões de Hollywood, cada qual com talentos bastante distintos entre si, mas que se completam. O roteiro de Anders, Brian Burns e John Morris continua formulaico, divertido aqui, artificioso ali, mas sobretudo muito corajoso e estimulante ao deixar de lado os protagonistas do primeiro filme e partir para outra. Agora, as loucuras de Brad Whitaker e Dusty Mayron, os novos amigos de infância do pedaço vividos por Ferrell e Wahlberg, respectivamente, dão lugar aos movimentos de atração e repulsa de Don e Kurt, os pais deles, que chegam, adivinhe, para o Natal. Outro mote de que o diretor faz excelente proveito.
A entrada em cena de John Lithgow e Mel Gibson, para repetir a lógica de confronto entre Brad e Dusty, poderia resvalar num carrossel de platitudes, mas a direção segura de Anders e as performances dos veteranos não permitem que ninguém se entedie. Kurt, um astronauta que usufrui a reserva dando a volta ao mundo e levando para a cama garotas com um terço da sua idade (uma blague metalinguística?), chega no mesmo voo que Don, o típico americano, carteiro aposentado, empático e prestativo a ponto de se compadecer de um entregador em apuros com um gigantesco caixote.
A ideia de serem “coavôs” de Megan e Dylan, os filhos de Dusty e Sarah criados por ela e Brad, e agora também Griffy, o rebento biológico do diretor artístico da Rádio Panda com a esposa, provoca em Kurt uma sensação nauseante parecida com a da ausência de gravidade numa missão ao espaço, enquanto Don está nas nuvens. Para tornar as coisas ainda mais confusas, Dusty se cansou da vida de easy rider e está num namoro firme com Karen, mãe de Adrianna. Aqui se faz, aqui se paga, Dusty.
As famílias resolvem acatar a sugestão de Kurt e vão passar as festas de fim de ano num chalé nas montanhas, perto de um resort de esqui, e então “Pai em Dose Dupla 2” entra no piloto automático, condição de que só sai numa sequência que mistura humor físico e piadas que escancaram a hipocrisia do politicamente correto, no baile de filhas e pais da escola de Megan a que Brad e Dusty comparecem na undécima hora. Até lá, nada de memorável, incluindo-se um acidente com uma máquina de remover neve protagonizado pelo personagem de Ferrell — muito semelhante ao episódio da Superleggera no primeiro filme —, e a caçada ao peru levada a termo por Megan, que por pouco não redunda em tragédia.
Scarlett Estevez e Owen Vaccaro, a propósito, continuam adoráveis e Linda Cardellini tem, afinal, de mostrar de maneira um pouco mais satisfatória o talento que a consagrou em “O Segredo de Brokeback Mountain” (2005), dirigido por Ang Lee, espetáculo que repete sem esforço em “Green Book: O Guia” (2018), levado ao ecrã por Peter Farrelly. Por outro lado, são pateticamente constrangedoras as participações de Alessandra Ambrósio e sua odiosa caderneta, John Cena e Chesley “Sully” Sullenberger, o próprio herói do rio Hudson do drama biográfico homônimo de Clint Eastwood, bem mais encantador nas entrevistas que concedera à época do incidente.
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