Se fosse possível condensar, em um único filme, a adrenalina das melhores cenas de perseguição, o humor leve e despretensioso e um romance peculiar, em que os amantes só conseguem superar seus desafios nos últimos instantes, o resultado seria algo muito próximo do que Patrick Hughes entrega em “Dupla Explosiva”. O diretor, com sua experiência no gênero de thrillers absurdos e escrachados, constrói um espetáculo que, embora caótico, mantém cada detalhe bem amarrado. Hughes recicla elementos que já havia explorado em “Os Mercenários 3” (2014) e “O Homem de Toronto” (2022), oferecendo ao público um enredo frenético e cativante, sem compromissos com a lógica ou a verossimilhança. Sob o comando do roteirista Tom O’Connor, a narrativa se desenrola de forma orgânica, arrastando o espectador para um universo onde o absurdo é a norma, até que este se veja completamente envolvido.
O filme começa com um vislumbre da vida idealizada de Michael Bryce, um agente secreto de altíssimo nível, interpretado por Ryan Reynolds. O dia perfeito de Bryce inclui um relógio suíço ao lado de uma foto de sua esposa, um terno impecável escolhido de um guarda-roupa organizado e um espresso tirado com precisão. Ele vive em uma mansão luxuosa de vidro e concreto, ao lado de sua esposa Amelia Roussel (Élodie Yung), com quem compartilha uma relação aparentemente ideal. Contudo, essa vida de sonho está prestes a desmoronar. Hughes mantém o público em suspense quanto à causa da queda de Bryce: um erro cuja origem pode estar na pressão do trabalho, em sua excessiva autoconfiança ou até mesmo em traços de sua personalidade que jamais foram devidamente diagnosticados.
Dois anos depois, encontramos Bryce em um cenário completamente diferente. Agora um mero segurança de luxo, ele dirige um carro modesto e está separado de Amelia, que, ao contrário dele, segue firme em sua carreira como espiã. Essa reviravolta só poderá ser revertida se Bryce tiver sucesso em uma missão insólita: proteger Darius Kincaid (Samuel L. Jackson), um ex-agente em decadência, durante sua transferência de Londres para a Holanda. Kincaid precisa testemunhar contra Vladislav Dukhovich (Gary Oldman), um ex-ditador da Bielorrússia, no Tribunal Penal Internacional.
A partir desse ponto, “Dupla Explosiva” mergulha de cabeça em sequências eletrizantes de perseguições por Londres e Amsterdã, filmadas com precisão cirúrgica e efeitos visuais que evocam a sensação de uma coreografia milimetricamente planejada. Essas cenas remetem ao trabalho de Christopher McQuarrie em “Missão: Impossível — Efeito Fallout” (2018), embora aqui a computação gráfica desempenhe um papel mais evidente. Enquanto isso, o humor ácido e, por vezes, exageradamente vulgar de Kincaid garante pausas cômicas, ao mesmo tempo que acelera a narrativa nos momentos em que o personagem de Jackson toma o protagonismo.
A dinâmica entre Bryce e Kincaid, com seus contrastes e dependências mútuas, sustenta boa parte do enredo. Samuel L. Jackson, como de costume, rouba a cena com seu carisma inconfundível, amplificado pela trilha sonora vibrante de Atli Örvarsson, que em certos momentos evoca uma variação do icônico tema de “007”. Canções como “Hello”(1983), de Lionel Richie, pontuam momentos cruciais, conferindo ao filme um charme adicional. Salma Hayek, no papel de Sonia, a esposa de Kincaid, adiciona uma pitada de romance e caos, enquanto Gary Oldman entrega uma performance convincente como o vilão do Leste Europeu, aparecendo em fragmentos breves, mas marcantes.
O que torna “Dupla Explosiva” uma experiência memorável é a versatilidade de seu elenco. Ryan Reynolds supera expectativas, enquanto Jackson e Oldman vão além dos limites esperados para personagens que poderiam facilmente cair no clichê. A trama, inicialmente centrada em um objetivo claro, se transforma em uma narrativa mais profunda sobre dois homens buscando redenção, cada um usando suas habilidades de formas completamente opostas. No entanto, apenas um deles alcançará essa absolvição.
Com seu equilíbrio perfeito entre ação desenfreada e humor irreverente, “Dupla Explosiva” se destaca como um filme que não se leva a sério, mas que sabe exatamente o que o público deseja: entretenimento puro, com pitadas de emoção e personagens que transcendem suas caricaturas iniciais.
★★★★★★★★★★