Cameron Crowe, renomado por sua sensibilidade em explorar a natureza humana e relações complexas, propôs em “Sob o Mesmo Céu” uma narrativa que pretendeu homenagear o Havaí e refletir sobre identidade, reconciliação e pertencimento. Contudo, o filme parece desviar-se desses objetivos ao tropeçar em uma execução inconsistente e desconexa. Anunciado como um tributo à cultura havaiana, o longa carece de profundidade na abordagem de temas importantes, como a luta dos nativos por autonomia e a riqueza cultural do arquipélago, relegando-os a meros acessórios narrativos. O roteiro, carregado de intenções, falha em traduzir essas em uma mensagem clara, deixando o espectador com a sensação de que o filme não sabe o que quer ser.
O enredo segue Brian Gilcrest, um ex-militar transformado em consultor técnico de um bilionário da segurança privada, que retorna ao Havaí após anos de afastamento e fracassos pessoais. Essa volta o coloca em rota de colisão com seu passado e o força a lidar com antigos amores, representados por Tracy Woodside, uma ex-namorada agora casada, e um futuro potencial interesse romântico, Allison Ng, uma capitã da Força Aérea que o acompanha em suas tarefas no arquipélago. A trama tenta equilibrar essas jornadas emocionais com um pano de fundo político-cultural, mas a execução é ofuscada por personagens pouco desenvolvidos e um tom hesitante que oscila entre comédia romântica e drama reflexivo.
Bradley Cooper, como Gilcrest, enfrenta o desafio de tornar crível um protagonista moralmente ambíguo, marcado por escolhas duvidosas durante sua trajetória no Afeganistão. Embora Cooper se esforce para trazer densidade emocional, o personagem é superficialmente explorado, o que enfraquece sua jornada de redenção. Emma Stone, por sua vez, assume o papel de Allison Ng, cuja caracterização gerou controvérsias. A escolha de Stone para interpretar uma personagem parcialmente havaiana foi amplamente criticada, evidenciando a desconexão do filme com a autenticidade cultural que pretendia celebrar. Apesar da energia que Stone traz à tela, a personagem carece de nuances, limitando seu impacto narrativo.
Em contraponto, Bill Murray e John Krasinski oferecem momentos de destaque. Murray, no papel do bilionário Carson Welch, empresta seu charme peculiar a um personagem cuja moralidade nebulosa traz um sopro de irreverência. Krasinski, como o reservado Woody, marido de Tracy, transmite uma complexidade silenciosa, estabelecendo uma das poucas dinâmicas verdadeiramente interessantes do filme. Tracy, vivida por Rachel McAdams, é reduzida a um papel acessório na narrativa, mais uma engrenagem na máquina emocional de Gilcrest do que uma personagem independente.
O longa ainda tenta recuperar fôlego com momentos esparsos de humor, protagonizados por Danny McBride como o coronel Lacy. Embora seus alívios cômicos sejam bem-vindos, eles não conseguem sustentar o ritmo vacilante. A trilha sonora, sempre um ponto forte em filmes de Crowe, destaca-se com escolhas como “Everybody Wants to Rule the World”, do Tears for Fears, evocando um vislumbre do brilhantismo que o diretor mostrou em obras anteriores. No entanto, nem mesmo esses acertos pontuais conseguem compensar os problemas estruturais do filme.
O clímax, que deveria amarrar as diversas linhas narrativas, é previsível e deixa mais perguntas do que respostas. A revelação de uma filha desconhecida de Gilcrest, em particular, é tratada de forma rasa e apressada, enquanto personagens como o general Dixon (Alec Baldwin) e a própria Allison Ng não recebem o desenvolvimento necessário para justificar sua relevância na trama.
“Sob o Mesmo Céu” poderia ter sido um estudo sensível sobre reconciliação e a conexão humana com a terra e a história, mas seu potencial é desperdiçado em uma narrativa que prefere se apoiar em convenções fáceis. Crowe, cujo histórico inclui clássicos como “Quase Famosos”, parece perdido em sua tentativa de equilibrar uma homenagem cultural com uma história de amor e autodescoberta. O resultado é um filme que, embora visualmente agradável e pontuado por atuações carismáticas, carece de coesão e propósito, deixando o espectador com a impressão de um potencial não realizado.
★★★★★★★★★★