“Transmitzvah”, dirigido por Daniel Burman, marca o retorno do realizador argentino ao cinema após quase uma década focado em séries e minisséries de streamings. Essa comédia dramática, escrita em parceria com Ariel Gurevich, explora questões de identidade, pertencimento e reconciliação familiar por meio da trajetória de Mumy Singer, uma cantora de música iídiche que enfrenta um passado não resolvido.
A trama começa com uma reflexão sobre ritos de passagem. Esses momentos, sejam formaturas, casamentos ou conquistas individuais, representam transições fundamentais. Para a comunidade judaica, o bar ou bat mitzvah é um rito que marca o fim da infância e o início da maturidade, tradicionalmente celebrado aos 13 anos. No caso de Mumy, interpretada por Penélope Guerrero, essa cerimônia foi um ponto de ruptura. Anos antes, ainda identificada como Reuben (Milo Burgess-Webb), Mumy chocou sua família ao pedir um bat mitzvah, versão feminina do ritual, desafiando as normas conservadoras da sua comunidade.
O desejo de Reuben de ser reconhecida como Mumy não era surpresa para a família, mas foi recebido com resistência, especialmente por seu pai, Arón (Alejandro Awada), que se recusou a aceitar a realização do bat mitzvah. Esse momento de rejeição moldou a relação deles e deixou marcas profundas. Anos depois, Mumy, agora uma cantora de sucesso, retorna a Buenos Aires para visitar Arón em seu leito de morte. Durante esse reencontro, Arón, tomado pelo arrependimento, pede perdão por não ter respeitado o desejo da filha, reafirmando seu amor. A despedida é emocionalmente impactante, mas desencadeia uma crise em Mumy, que, devastada, perde sua voz.
Determinada a superar o trauma, Mumy acredita que realizar o bat mitzvah é essencial para resgatar sua paz interior. A partir daí, embarca em uma busca desafiadora por um rabino disposto a conduzir a cerimônia, enfrentando novas barreiras dentro da comunidade. Auxiliada por seu irmão Eduardo (Juan Minujín), a jornada de Mumy torna-se uma reflexão profunda sobre identidade e pertencimento, indo além de questões de gênero. O filme nos apresenta uma protagonista cuja força exterior contrasta com as vulnerabilidades internas, mostrando que até mesmo pessoas aparentemente resolvidas carregam cicatrizes que precisam ser confrontadas.
A narrativa de “Transmitzvah” equilibra humor e sensibilidade, conduzindo o espectador por momentos de emoção e introspecção. Guerrero e Minujín entregam atuações cheias de química, especialmente ao retratar a cumplicidade entre os irmãos, que se apoiam mutuamente na busca por respostas. Com direção delicada e roteiro envolvente, o filme nos lembra que a reconciliação com o passado é essencial para seguir em frente. Disponível na Netflix, “Transmitzvah” é uma obra que celebra a aceitação, a resiliência e a busca incessante por identidade.
★★★★★★★★★★