A trajetória de Wladyslaw Szpilman, um dos mais renomados pianistas poloneses da década de 1930, é marcada por uma jornada de sobrevivência que transcende o contexto histórico do Holocausto. Aluno de discípulos diretos de Franz Liszt, Szpilman ganhou notoriedade ao se apresentar em prestigiados concertos e como figura frequente na rádio polonesa. Ele chegou a realizar turnês ao lado do violinista Bronislav Gimpel, consolidando sua reputação como um dos grandes músicos de sua época. No entanto, sua carreira foi brutalmente interrompida quando, como milhões de judeus, ele e sua família foram confinados no gueto de Varsóvia durante a ocupação nazista.
Sua experiência de sobrevivência é narrada em “O Pianista”, autobiografia publicada em 1946 pela editora Wiedza, pouco depois do término da Segunda Guerra Mundial. Anos mais tarde, uma versão expandida do livro foi lançada em 1998, sendo amplamente traduzida e publicada em vários países. O reconhecimento foi imediato: em 1999, a obra recebeu o título de Livro do Ano por veículos como Los Angeles Times, The Economist e The Guardian. Entre 2000 e 2003, manteve-se entre os mais vendidos em diversos mercados, reafirmando sua importância como um relato essencial sobre o Holocausto.
A adaptação cinematográfica de Roman Polanski, lançada em 2002, elevou ainda mais a história ao colocá-la entre os 50 melhores filmes da história, segundo críticos especializados. Com sete indicações ao Oscar, o filme conquistou três prêmios: Melhor Ator para Adrien Brody, Melhor Direção para Polanski e Melhor Roteiro Adaptado. A cerimônia do Oscar, contudo, ficou marcada pela ausência de Polanski, que vive na Suíça devido a uma condenação na Justiça norte-americana.
O longa apresenta a trajetória de Szpilman desde os primeiros impactos da invasão alemã na Polônia até sua luta pela sobrevivência. Sua família foi deportada para o campo de extermínio de Treblinka, mas Szpilman foi poupado graças à intervenção de um conhecido da Polícia dos Guetos. Ele permaneceu no gueto até 1943, sobrevivendo como trabalhador forçado, até sua dissolução. O filme acompanha sua jornada, que inclui o envolvimento com o contrabando de armas para a resistência judaica e uma série de esconderijos improvisados em porões, prédios em ruínas e nos escombros de Varsóvia. Durante esse período, Szpilman foi descoberto pelo oficial nazista Wilm Hosenfeld. Em um ato surpreendente de humanidade, Hosenfeld não apenas poupou sua vida, mas o ajudou, fornecendo comida e roupas para protegê-lo do rigoroso inverno.
A estética do filme é uma aula de simbolismo. A fotografia, com tonalidades desbotadas, reflete a degradação física e emocional causada pela guerra. A atuação de Adrien Brody é um dos pilares do sucesso do longa. Aos 29 anos, Brody não apenas perdeu cerca de 15 quilos para o papel, mas também mergulhou no isolamento para absorver a essência do personagem. Sua dedicação lhe rendeu o Oscar de Melhor Ator, tornando-o o mais jovem a receber a honraria nessa categoria.
Para Polanski, dirigir “O Pianista” foi mais que um exercício artístico; foi uma experiência profundamente pessoal. Ele próprio sobreviveu ao Holocausto, tendo enfrentado os horrores da guerra desde a infância. Nascido em Paris, Polanski e sua família mudaram-se para Cracóvia durante a ocupação nazista. Sua mãe foi enviada a Auschwitz, onde faleceu, enquanto seu pai sobreviveu ao campo de Mauthausen-Gusen. Polanski, por sua vez, passou parte da infância vagando entre guetos e florestas até reencontrar o pai após o fim da guerra. Essa conexão íntima com os eventos históricos conferiu ao filme uma autenticidade e profundidade únicas.
Disponível na Netflix, “O Pianista” não é apenas uma história de resiliência, mas também um testemunho poderoso sobre as escolhas humanas em tempos extremos. A obra de Polanski transcende o status de filme histórico, consolidando-se como uma reflexão atemporal sobre a coragem, a compaixão e os limites do espírito humano frente à barbárie.
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