Toda relação conjugal traz consigo nuances de risco e estratégia. Não há nada mais previsível para um casal em crise do que decidir, de forma quase impulsiva, reviver o entusiasmo juvenil em uma tentativa de resgatar algo que, no fundo, ambos sabem estar à beira do colapso. Crises são quase uma constante nas relações humanas, e muitos acreditam que o afastamento estratégico pode reacender a paixão. Contudo, o verdadeiro desafio surge ao lidar com os problemas subjacentes, frequentemente mais complexos e enraizados, exigindo mudanças profundas e mútuas. Ignorar essas questões ou tratá-las unilateralmente é um erro que pode transformar o esforço de reconciliação em um exercício de futilidade.
Em “Ready or Not”, os recém-casados Grace e Alex ainda não enfrentaram as provações mais intensas que a vida a dois pode oferecer. Contudo, o que deveria ser uma noite de núpcias se transforma em uma situação que redefine os conceitos de desafio e sobrevivência. A narrativa, conduzida por Matt Bettinelli-Olpin e Tyler Gillett, mistura habilmente o terror e o humor macabro, consolidando a dupla como referência no cinema de horror contemporâneo. A proposta lembra outras produções marcantes dos diretores, como “Abigail” (2024), que explora a jornada de uma jovem rica e traumatizada presa em um cativeiro calculado, enquanto seus sequestradores esperam um vultuoso resgate.
Desta vez, o roteiro de Guy Busick e R. Christopher Murphy mergulha em uma zona ambígua, onde as aparências são constantemente desafiadas. Grace, interpretada com maestria por Samara Weaving, é uma protagonista que carrega as marcas de suas escolhas erradas, ainda que jamais esperasse que elas culminassem em um cenário tão grotesco. Sua união com Alex, um herdeiro de família rica, rapidamente deixa de ser um conto de fadas para se tornar um pesadelo, quando a tradição mórbida dos Le Domas é revelada. Ao invés de comemorar a nova etapa de sua vida, Grace é forçada a participar de uma “brincadeira” mortal: um jogo de esconde-esconde em que a derrota significa sua execução.
A tensão do enredo cresce à medida que os membros da família de Alex se tornam caçadores implacáveis, movidos pela crença de que o fracasso em eliminar Grace desencadeará uma maldição devastadora sobre todos eles. O filme equilibra habilmente a brutalidade da trama com momentos de humor ácido e imprevisível, criando uma atmosfera que diverte e perturba em igual medida. Samara Weaving é o coração da produção, trazendo intensidade e carisma à sua performance, enquanto Mark O’Brien contribui com interações eficazes que ampliam o impacto emocional da história.
Embora “Ready or Not” não tenha a profundidade psicológica de um romance de Stephen King, a construção do suspense e a exploração das dinâmicas familiares disfuncionais evocam um espírito similar. O filme entrega uma experiência visceral e eletrizante, consolidando-se como uma peça singular no gênero ao combinar um comentário social mordaz com a violência estilizada, que, de certa forma, transforma o casamento em uma metáfora sombria de sobrevivência literal e figurativa.
★★★★★★★★★★
