Há quem desça ao reino dos mortos para resgatar seu amor de um fim prematuro e cruel. Assim se passou com Orfeu, o filho do deus Apolo e da musa Calíope, que foi ao Hades em busca de Eurídice, uma bela mulher comum, depois que ela sucumbiu à picada de uma serpente ao fugir do cerco do pastor Aristeu. Por improvável que soe, “O Amor Mandou Mensagem” mantém alguns pontos de intersecção com o conto da mitologia grega, que muito antes foi explorado pelo compositor alemão Christoph Willibald Gluck (1714-1787) na ópera de mesmo nome, lançada num 5 de outubro, o de 1762, na Itália.
James C. Strouse não é Gluck, “O Amor Mandou Mensagem” não é sofisticado como a arte dramática em irmandade com a música erudita, porém chega aonde se propõe. Uma primeira história de amor acaba em tragédia e outra floresce em seu lugar, movida por uma conveniência tecnológica que somente estes nossos tempos permitiriam, em manobras muito bem-planejadas e cheias de detalhes do diretor e suas corroteiristas, Sofie Cramer e Andrea Willson.
Mira Ray, uma premiada ilustradora de livros infantis, poderia ter vivido um grande amor com John, mas por razões que escapam à lógica, ele morre atropelado ao cruzar a rua depois de um encontro dos dois num café. O luto prolonga-se para além do que ela e qualquer pessoa próxima suporia, e a irmã, Suzy, de Sofia Barclay, recomenda-lhe enviar mensagens para o telefone de John, que ela julga ter sido desativado. Embora breves, as cenas dos personagens de Priyanka Chopra Jonas e Arinzé Kene prestam-se a dar a tônica do que vem a seguir, uma sucessão de lances mais ou menos melancólicos, intermediados por uma ou outra entrada alheia ao finado namoro de Mira e John. O crítico musical Rob Burns não entende muito sobre cores e imagens que despertam o interesse dos pequenos; assim mesmo, entra no radar de Mira, porque, vejam só, justamente o seu novo telefone corporativo foi feito da carcaça do antigo aparelho de John.
Reciclando também o mote de “P.S. Eu Te Amo” (2007), de Richard LaGravenese, Strouse consegue passar por cima da natural confusão semântica de seu filme e aposta no entrosamento de Chopra Jonas e Sam Heughan, a melhor coisa no longa ao saber dosar a resistência inicial e cínica e o crescente desejo de conquistar a mocinha enlutada. Talvez o calcanhar de Aquiles de “O Amor Mandou Mensagem” seja não acreditar na força da história e apelar às dispensáveis participações de Céline Dion e Nick Jonas, enquanto coadjuvantes de peso como Russell Tovey e Celia Imrie ficam de quina.
★★★★★★★★★★