Tom Ford, conhecido por sua trajetória como estilista e sua passagem por marcas de prestígio como Gucci e Saint Laurent, deu um passo audacioso em sua carreira ao dirigir filmes. Sua estreia no cinema ocorreu em 2009 com o drama “Direito de Amar”, estrelado por Colin Firth, Matthew Goode e Julianne Moore, que conquistou aclamação crítica e rendeu uma indicação ao Oscar. Em 2016, Ford retornou com “Animais Noturnos”, um thriller psicológico que também foi bem recebido, destacando-se com uma indicação ao Oscar para Michael Shannon como melhor ator coadjuvante. Aaron Taylor-Johnson foi premiado com o Globo de Ouro pela sua atuação no mesmo filme.
O enredo de “Animais Noturnos” gira em torno de Susan (Amy Adams), uma galerista renomada que, após anos de silêncio, recebe um manuscrito escrito por Edward (Jake Gyllenhaal), seu ex-marido. A relação entre eles foi interrompida há quase duas décadas, e Susan vive um casamento sem paixão com Hutton (Armie Hammer), que frequentemente se ausenta e é infiel. Na solidão de uma noite insone, Susan se dedica à leitura do livro intitulado ‘Animais Noturnos’, que Edward a dedica em um gesto carregado de significado, evocando memórias do passado e chamando-a de volta para um tempo de sentimentos intensos e decisões irrevogáveis.
Conforme mergulha na leitura, Susan é transportada para um turbilhão de lembranças, revisitando momentos do relacionamento com Edward. Vinda de uma família abastada, ela revive o início do amor entre eles e a crescente tensão que os separou. O casamento, inicialmente construído em torno de sonhos compartilhados, desmoronou sob a pressão das expectativas familiares e da frustração com as ambições literárias de Edward, que não encontraram o reconhecimento que ela esperava. A escolha de Susan de trocar Edward por Hutton, em busca de estabilidade, resulta em um vazio emocional que a persegue.
A narrativa do livro de Edward se entrelaça com a realidade de Susan de maneira imersiva. A obra fictícia, inspirada por sentimentos profundos, aborda um crime perturbador e a luta por justiça de Tony, personagem interpretado por Jake Gyllenhaal na história paralela. Tony enfrenta a devastação de perder sua esposa e filha em um ato brutal comandado por Ray Marcus (Aaron Taylor-Johnson). A busca implacável de Tony por vingança é um reflexo simbólico da dor que Edward enfrentou após a separação de Susan. O livro, com seu tom visceral e impacto emocional, força Susan a encarar a frieza de suas decisões e o arrependimento que a consome.
O filme vai além de uma simples adaptação; ele constrói um universo que explora de forma profunda a complexidade das escolhas humanas e suas repercussões. As cenas que representam a juventude de Susan destacam o dilema entre o amor sincero e as aspirações impostas por sua mãe, vivida por Laura Linney, cuja figura é um lembrete constante da pressão pelo status e pela segurança.
A experiência de Susan com o manuscrito a leva a uma jornada de autoavaliação. Conforme a narrativa alterna entre a ficção do livro e a vida real, o público é convidado a testemunhar um confronto entre passado e presente. O clímax do filme se dá quando Susan, movida por um desejo de reconciliação, decide marcar um encontro com Edward. O que poderia ser uma chance de redenção e compreensão, transforma-se em um golpe final quando Edward não aparece, encerrando qualquer possibilidade de contato e deixando Susan sozinha com suas reflexões e a compreensão do impacto das escolhas que fez.
Esse desfecho, em que Edward decide não se encontrar com Susan, é a expressão máxima de sua libertação e sua declaração de independência emocional. É uma conclusão que realça a narrativa sobre o legado de feridas emocionais e a busca por sentido em meio a perdas e traições.
A visão de Tom Ford é realçada por performances notáveis de Amy Adams e Jake Gyllenhaal, que dão vida a personagens complexos e cheios de camadas. A cinematografia de Seamus McGarvey, com sua estética que combina a elegância e o estilo neo-noir, cria uma atmosfera densa e sedutora, enquanto a trilha sonora sublinha a tensão e a introspecção, tornando “Animais Noturnos” uma reflexão profunda sobre arrependimento e as consequências inescapáveis das decisões tomadas ao longo da vida.
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