Velhice é um estado de espírito. Certo, essa frase não é original — nem vale para todo mundo —, mas há quem resolve, já trilhada boa parte do caminho, fazer o movimento capaz de derrubar preconceitos e ideias ditas sensatas acerca da melhor postura atingida uma idade qualquer e desfrutar de experiências inéditas, sublimes, transformadoras ou “apenas”, por que não?, revigorantes. Que indianos têm uma percepção muito singular da existência (e de tudo que venha a referir-se a ela) não é novidade; assim mesmo, sempre há margens para surpresas, como em “O Atleta de 69 Anos”, um filme bem-humorado sobre assuntos sérios.
Akshay Roy confirma uma tendência das plataformas de streaming quanto a dar cada vez mais espaço a produções da Índia, e aqui, numa história previsível, consegue fazer rir e chorar sem esforço, decerto por estar lidando com a vida como ela é, embora nem todos reconheçam-na. Em diálogos objetivos e cortantes, Roy e o corroteirista Abbas Tyrewala iluminam aqueles momentos que muita gente quer esquecer ou nos quais não quer pensar, mas que fazem parte do estar no mundo e podem, sim, ser bons. Como todos os outros.
Vijay, o atleta de 69 anos do título, foi um nadador semiprofissional na juventude. Ele desistiu do sonho de alçar voos mais altos e chegar às grandes competições mundiais, apesar de ter se mantido na carreira como treinador do clube do bairro. O diretor explicaque Vijay abdicou de um futuro no esporte por causa da esposa, que enfrentava um câncer, e ele teve de, sozinho, criar a filha do casal. Da mesma forma que é construída uma imagem heroica de Vijay, o enredo também se inclina a expor suas fraquezas, culminando na cena em que amigos e familiares estão reunidos numa cerimônia que simboliza seu funeral, enquanto ele bebe como se não houvesse amanhã, numa nostalgia entre amargurada e poética.
Especula-se sobre o suicídio desse homem admirável, mas colérico, gancho de que Anupam Kher se vale para dar cores mais humanas ao protagonista, um pai amoroso e um avô derretido que revela-se um guerreiro incansável quando o tempo vira. A amizade de Vijay com Fali, de Chunky Pandey, seu anjo da guarda, sonhador feito ele, reforça essa ideia de solidão e amparo muito presente quando se é velho, uma concessão com que nos regala o destino.
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