O valor de uma vida humana é um tema delicado e controverso, e esta reflexão não surge de uma perspectiva filosófica, mas de um exercício jurídico prático. Kenneth Feinberg, advogado e mediador de conflitos, expõe essa questão com uma carga pesada de realismo e ironia, questionando seus alunos: qual o preço de uma existência? Sua trajetória, ancorada por dilemas éticos, é uma tentativa de mensurar o imensurável.
Em “Quanto Vale?”, Michael Keaton interpreta Feinberg, um advogado com reputação de metódico e racional, confrontado pelo desafio monumental de liderar o Fundo de Compensação às Vítimas dos ataques de 11 de setembro. A missão? Determinar o valor financeiro devido a cada família afetada. A iniciativa, além de fornecer algum alívio às vítimas, visava evitar uma avalanche de processos contra as companhias aéreas cujos aviões foram sequestrados. A complexidade do cálculo, porém, vai além das friezas numéricas.
Sob a direção de Sara Colangelo, o filme se aprofunda nas implicações filosóficas desse processo. A legislação exige que se considere variáveis como idade, estado de saúde e potencial de ganhos futuros de cada vítima. Entre a burocracia e a humanidade, surge a questão: pode-se medir uma vida apenas com base em sua produtividade econômica? Em meio a essas escolhas áridas, o advogado se vê questionando a própria essência da justiça e da compensação.
Apoiando-se em Camille Biros, interpretada por Amy Ryan, Feinberg enfrenta uma teia de interesses conflitantes: a pressão das empresas, o rigor da lei e a dor das famílias. Entre os muitos que se opõem à proposta inicial está Charles Wolf, vivido por Stanley Tucci, cuja esposa morreu nos atentados. Insatisfeito com os termos do fundo, ele lança o movimento Fix the Fund, desafiando Feinberg a repensar sua abordagem. A tensão entre os dois personagens é um ponto central na trama.
A narrativa adota um tom quase documental, apresentando depoimentos de personagens que personificam vítimas reais. Cada relato expõe situações particulares, desde imigrantes em situação irregular até casais homoafetivos desamparados pela legislação da época. Essas histórias conferem profundidade à trama, destacando a universalidade da dor e a singularidade de cada perda.
“Quanto Vale?” retrata o prazo exíguo para que Feinberg garantisse a adesão de 80% das famílias elegíveis até dezembro de 2003. Apesar das dificuldades, uma improvável reviravolta ocorre quando Wolf, após uma conversa decisiva com Feinberg, aceita os termos do fundo. Embora o filme não revele detalhes significativos dessa troca, a mudança de perspectiva de Wolf sugere uma complexidade que fica fora de cena.
A força do filme está em dar espaço a personagens que, em outras narrativas, seriam meros coadjuvantes. Histórias como a do bombeiro Nick, morto durante os resgates, ganham destaque em interpretações marcantes, humanizando ainda mais a trama. Essas inserções reforçam o impacto emocional da jornada de Feinberg.
Em última análise, “Quanto Vale?” não entrega respostas definitivas. A questão central permanece: quanto vale uma vida? Talvez a resposta não seja tão importante quanto a reflexão provocada. O filme revela as imperfeições do sistema legal e a desigualdade que persiste, mesmo sob o manto da igualdade jurídica. A mensagem final é clara: resignar-se nunca deve ser uma opção.
★★★★★★★★★★