No filme “Extraordinário” (2017), dirigido por Stephen Chbosky, o público se envolve profundamente na jornada singular de um menino que enfrenta desde cedo as complexidades do mundo além de seu universo familiar. Baseado na obra homônima de R.J. Palacio, a adaptação é uma representação tocante da vida de August Pullman, um garoto que, ao lutar contra uma condição congênita rara, se depara com os desafios de se integrar em uma sociedade que, muitas vezes, não compreende ou aceita as diferenças.
Chbosky, também conhecido por “As Vantagens de Ser Invisível” (2012), narra aqui um momento marcante na vida de Auggie. Nascido com deformações faciais que exigiram uma série de procedimentos cirúrgicos desde os primeiros dias de vida, Auggie encara não apenas as dificuldades físicas, mas também o peso de conviver com o olhar alheio. O roteiro, que Chbosky coescreveu com Jack Thorne e Steve Conrad, mostra em flashbacks a angústia dos pais, interpretados por Julia Roberts e Owen Wilson, ao verem o filho passar por cirurgias que pareciam intermináveis — um começo de vida marcado por uma luta constante.
R.J. Palacio se inspirou para o livro após um encontro em uma sorveteria com uma criança com características semelhantes às de Auggie, embora seja provável que também tenha se baseado na vida de Roy Lee Dennis, conhecido como Rocky, que viveu com displasia craniodiafisária. Esse transtorno gera um acúmulo de cálcio no crânio, provocando problemas de visão e audição. A história de Rocky foi abordada em “Marcas do Destino” (1985), filme de Peter Bogdanovich que retrata como ele desafiou os estigmas sociais em um contexto de rebeldia dos anos 1970. Comparado a Rocky, Auggie tem uma trajetória menos dramática, protegida pelo carinho incondicional de sua mãe.
No longa, Isabel, a mãe de Auggie, abandona a carreira como ilustradora e seu mestrado para educar o filho em casa, até o momento em que decide que ele deve frequentar uma escola regular. Mesmo com a relutância do pai, vivido por Wilson, Isabel acredita que essa experiência trará a independência e o amadurecimento que Auggie precisa. Entre momentos de cumplicidade e conflitos familiares, surge também o ressentimento de Olivia, a irmã mais velha de Auggie, que se sente esquecida na dinâmica familiar. Interpretada por Izabela Vidovic, Olivia é afetada pela recente perda de sua avó, uma personagem dispensável, interpretada por Sônia Braga.
À medida que Auggie se ajusta ao ambiente escolar, ele enfrenta o bullying e a aceitação seletiva, enquanto desenvolve amizades que testam a sinceridade dos laços humanos. A presença de Mandy Patinkin, como o diretor Tushman, traz um tom firme ao combate ao bullying, e Jacob Tremblay, no papel de Auggie, oferece uma interpretação convincente e sensível, exibindo a força e a vulnerabilidade de um garoto que amadurece rapidamente em meio a situações complexas. Tremblay capta com intensidade a dualidade de euforia e introspecção de Auggie, tornando o personagem o coração do filme.
“Extraordinário” toca na questão da aceitação e do respeito em uma sociedade nem sempre acolhedora. Se a narrativa tivesse se centrado ainda mais em Auggie, explorando em profundidade suas emoções e desafios, talvez a obra pudesse alcançar uma dimensão ainda mais tocante e reflexiva.