Drama norueguês vencedor do Oscar é reflexão inteligente sobre conformismo e está na Netflix Rolf Konow / Vitrin Filmes

Drama norueguês vencedor do Oscar é reflexão inteligente sobre conformismo e está na Netflix

Na maturidade, a vida adquire uma cadência própria, uma espécie de melancolia suave que afasta gradualmente tudo aquilo que um dia nos parecia satisfatório. Há quem enfrente esse sentimento com persistência; outros, desamparados, resignam-se. Mas, em ambos os casos, a impressão dominante é de que a essência da existência se dissipa, dando lugar a uma resistência obstinada e ao pressentimento da finitude. Em momentos assim, qualquer auxílio parece válido, e mesmo métodos inconvencionais ganham legitimidade temporária — ao menos até que se descubra uma alternativa mais eficaz para lidar com as angústias que não podem esperar.

É fácil identificar-se com os personagens de “Druk — Mais uma Rodada”, filme dirigido por Thomas Vinterberg, no qual ele explora a trajetória de quatro amigos e professores do ensino médio que, inspirados por uma inquietação proustiana, tentam recuperar o tempo perdido. Durante essa jornada, Vinterberg, junto ao corroteirista Tobias Lindholm, atribui um verniz científico a uma descoberta arriscada e, ao mesmo tempo, intrigante de um dos personagens. O experimento, conduzido com um controle que beira o absurdo, leva a consequências sociais incalculáveis, abrindo espaço para uma crítica mordaz à rotina e ao conformismo.

Logo na abertura, o filme apresenta uma competição entre adolescentes, que testam seus limites com a bebida, culminando em uma sequência de eventos que inclui um incidente no metrô, onde um dos jovens chega a algemar o segurança em uma barra de ferro. Vinterberg mantém o ritmo acelerado, transicionando rapidamente entre cenas, deixando ao público a tarefa de conectar os pontos. No colégio, o ocorrido se torna tema de discussão no conselho de professores.

Enquanto isso, os docentes seguem com suas aulas desanimadas, porém é Martin quem mais claramente sofre com um descontentamento latente, evidenciado na atuação impecável de Mads Mikkelsen. Ele personifica o abatimento, uma sensação que muitos conhecem em diferentes estágios da vida. Martin é o que mais explicitamente mostra os sinais da crise, a ponto de ter dificuldade até para sair da cama. Mas ele não está sozinho; seus três amigos enfrentam também a meia-idade de forma desajeitada, em um momento no qual até mesmo a paixão pelo ensino se perdeu, incapaz de gerar o mesmo prazer ou inspiração de outrora. A esperança, porém, ressurge quando uma informação inesperada os incita a buscar algo novo.

Um estudo sugere que os seres humanos nascem com um déficit natural no nível de álcool no sangue, e Martin, ainda que professor de história, vê nesse achado uma possível resposta para seu mal-estar. Ele decide experimentar manter uma taxa alcoólica de 0,05% constantemente, incluindo durante o expediente. Aos poucos, ele convence seus amigos a aderir à ideia. O papel de Mikkelsen é, sem dúvida, o ponto central de um filme que flerta com o burlesco e o exagero, no qual Vinterberg desenha um final ao mesmo tempo irônico e quase espiritual, uma alegoria precisa do efeito de doses desmedidas no espírito humano.


Filme: Druk — Mais uma Rodada
Direção: Thomas Vinterberg
Ano: 2020
Gêneros: Comédia/Thriller
Nota: 9/10