Com 187 indicações a prêmios, thriller biográfico vencedor de 3 Oscars, de David Fincher, está na Netflix Merrick Morton / Columbia TriStar

Com 187 indicações a prêmios, thriller biográfico vencedor de 3 Oscars, de David Fincher, está na Netflix

Um homem atinge o topo do sucesso ao pisar em todos ao seu redor: vinga-se de uma ex-namorada, trai seu melhor amigo, despreza quem o ajudou e afasta os sócios que se tornam inconvenientes. Em “A Rede Social” (2010), dirigido por David Fincher, Mark Zuckerberg é retratado como um bilionário cuja única relação verdadeira é com o dinheiro. Mesmo pagando indenizações para aqueles que prejudicou, sua fortuna cresce vertiginosamente. A produção, amplamente reconhecida no Oscar, nos deixa uma questão perturbadora: como um site que promove a amizade pode ter sido fundado em meio a tamanha falta dela?

“A Rede Social” manipula de maneira sutil a ideia de amizade. A relação entre Mark Zuckerberg (interpretado por Jesse Eisenberg) e Eduardo Saverin (Andrew Garfield), que começou como uma sólida parceria, lentamente se desfaz à medida que o projeto de criar uma plataforma digital se transforma em um império global. A princípio, o Facebook nasce como um clube exclusivo de Harvard, permitindo que os estudantes conectem suas próprias redes de contatos. Rapidamente, a ideia ganha força, atingindo bilhões de usuários. O rompimento entre Zuckerberg e Saverin é impulsionado pela entrada de Sean Parker (Justin Timberlake), cofundador da Napster, cujo histórico problemático instiga uma cisão definitiva. Parker, embora de curta participação, desempenha um papel fundamental ao dividir a dupla e, posteriormente, se afastar, mantendo uma pequena fatia da empresa.

Embora a trama do filme seja inspirada em eventos reais, críticos apontam que ela não segue fielmente os fatos. No entanto, o valor do filme está em sua poderosa narrativa, que nos conduz a uma reflexão sobre a dissonância entre a imagem pública das redes sociais e os bastidores repletos de tensões. No Facebook, o conceito de “amizade” se apresenta de maneira simplificada e harmoniosa, mas, no enredo do filme, vemos o lado sombrio desse mundo digital, onde ambição e conflitos financeiros são as forças motrizes. A criação da plataforma envolve um jogo arriscado: o lançamento do site sem o consentimento de todos os parceiros, a manipulação de Saverin para conseguir investimentos iniciais e, finalmente, a decisão entre lucrar com anunciantes ou conquistar investidores. Apesar dos litígios e traições, o saldo final foi positivo para Zuckerberg, consolidando o triunfo do capital sobre os laços afetivos.

A crítica também atinge uma questão racial latente no filme. A narrativa foca em jovens milionários brancos que, além de sua frieza empresarial, demonstram pouco respeito por outras culturas. Saverin, por exemplo, que é brasileiro, é marginalizado, e mulheres asiáticas são retratadas de forma fetichista e superficial. Além disso, o filme cria uma oposição entre nerds vingativos e atletas loiros, talvez um reflexo das frustrações de Zuckerberg com seus fracassos pessoais e amorosos.

Ao assistir ao filme, surge uma questão importante: as redes sociais, como o Facebook, substituíram ou transformaram a ideia de amizade? A amizade tradicional, que já vinha perdendo força com a urbanização e a ascensão da mobilidade social, se tornou cada vez mais superficial, baseada em lazer e consumo. Pode-se questionar se esses princípios de amizade realmente foram algum dia hegemônicos, ou se a falsidade e a traição sempre estiveram presentes. Redes sociais como Facebook, Twitter e o extinto Orkut parecem preencher um vazio deixado pela erosão dos laços sociais tradicionais, criando uma nova forma de conexão em uma sociedade cada vez mais fragmentada.

Essas plataformas prosperam porque oferecem ilusões que atendem a necessidades emocionais genuínas. As pessoas querem amigos, mas a confiança é escassa. Os perfis no Facebook tornam-se uma forma de manter conexões com estranhos que, com o tempo, podem parecer tão próximos quanto familiares. Na era da superficialidade, a representação dessas conexões é muitas vezes mais valorizada do que a própria realidade. Mergulhamos nas narrativas tecnológicas, nas redes universitárias e nas grandes corporações, tentando entender melhor como esses fenômenos moldam o mundo em que vivemos e nos afetam profundamente.

O filme, mais do que uma simples história de empreendedorismo digital, é uma análise crítica das mudanças sociais e do modo como a tecnologia redefine relações humanas, colocando lucro e ambição acima de tudo.


Filme: A Rede Social
Direção: David Fincher
Ano: 2010
Gêneros: Drama/Ficção Histórica
Nota: 10/10