O melhor suspense policial polonês de 2024: O filme mais assistido do mundo na Netflix no momento Bartosz Mrozowski / Netflix

O melhor suspense policial polonês de 2024: O filme mais assistido do mundo na Netflix no momento

Nos últimos tempos, produções como “Assalto Brutal” têm ganhado espaço na cena cultural contemporânea da Polônia, explorando com riqueza de nuances — e, em certos momentos, uma deliberada ambiguidade — os resquícios do estado paranoico que dominou o país até a derrocada do regime comunista nos anos 1990. A recepção dessa abordagem pode ser analisada sob dois prismas contrastantes. Por um lado, essas narrativas funcionam como uma tentativa de revisão histórica, permitindo à sociedade confrontar traumas coletivos e ajustar contas consigo mesma. No entanto, há quem veja nesse movimento um desgaste temático, afastando aqueles que buscam algo mais leve e inovador. É nesse terreno instável que Michał Gazda se aventura, trazendo à tona uma história real soterrada pelas névoas implacáveis do tempo.

O ponto de partida é um erro simples, mas fatal: um alarme desativado, que resulta na morte de quatro funcionários e no que viria a se tornar um dos maiores roubos a banco da história da Polônia. A nação, ainda se reerguendo após quatro décadas de regime comunista, vê-se novamente diante do desafio de manter a estabilidade. A missão de investigar o caso recai sobre o detetive Tadeusz Gadacz, um homem com ambições de recuperar o prestígio perdido e restaurar sua relevância. Contudo, sua tarefa vai além da complexidade do crime em si: ele precisa navegar por um ambiente profissional onde a desconfiança é a norma, lidando com colegas mais jovens — muitos deles filhos dos antigos dirigentes socialistas, figuras outrora alvo da hostilidade policial. Nessa dinâmica, Olaf Lubaszenko entrega uma interpretação cuidadosa, captando as dualidades do protagonista: um misantropo marcado pela morte da esposa, mas ainda determinado a restabelecer uma conexão com a filha distante. 

O roteiro, assinado por Dana Lukasinska e Bartosz Staszczyszyn, articula uma narrativa em que as forças políticas e emocionais se entrelaçam. A trama se desenvolve sob a ótica de Kasper, um ex-recruta que trabalha como segurança no banco assaltado e acaba se tornando o principal suspeito na investigação conduzida por Gadacz. Embora o ritmo inicial seja deliberadamente lento, permitindo que as tensões latentes ganhem corpo, o enredo ganha densidade à medida que se aprofunda na relação conturbada entre o investigador e seu principal alvo. Jedrzej Hycnar oferece uma interpretação complexa de Kasper, expressando as contradições internas de um personagem dividido entre culpa e sobrevivência. 

O desfecho é tanto uma conclusão narrativa quanto uma metáfora afiada: enquanto um dos personagens cai, o outro luta para se reerguer, espelhando o tumulto institucional que assolava a Polônia há 34 anos. A privatização dos bancos estatais, vista por muitos como a solução definitiva para pôr fim aos esquemas de lavagem de dinheiro operados por máfias da Europa Oriental, acaba se revelando uma promessa ilusória. A mensagem final é clara: a transição para um novo sistema é sempre mais complexa do que parece, e a herança do passado não é facilmente apagada.


Filme: Assalto Brutal
Direção: Michał Gazda
Ano: 2024
Gêneros: Drama/Policial 
Nota: 8/10