Parceiros de muitos projetos, como as séries “Meu Querido Zelador” e “O Faz Nada”, e os filmes “O Cidadão Ilustre” e “O Homem do Lado”, Gastón Duprat e Mariano Cohn retomam sua colaboração em “4×4”, um thriller em que a tensão aumenta a cada cena e que traz uma crítica sociopolítica à questão da segurança pública na Argentina.
Disponível na Max, o longa-metragem tem uma hora e meia de duração e acompanha Ciro (Peter Lanzani), um jovem marginalizado que arromba um SUV 4×4 estacionado em uma rua de Buenos Aires. Após invadir o carro e tentar furtar o sistema de som, ele se vê preso dentro do veículo, sem qualquer possibilidade de fuga. Ciro, na verdade, caiu em uma armadilha.
O automóvel, completamente blindado e equipado com um sofisticado sistema de segurança monitorado à distância, pertence ao médico obstetra Enrique (Dady Brieva), que está com câncer terminal e relata por ligação já ter sido vítima de furtos, assaltos ou de algum tipo de violência urbana em 28 ocasiões. Por conta disso, ele decidiu reforçar a segurança com toda a tecnologia disponível para acabar com a situação.
Preso no carro, Ciro tenta de tudo: quebrar os vidros, acessar o sistema de segurança no porta-malas, atirar nas partes metálicas e até danificar a lataria com uma chave de fenda, mas nenhuma dessas alternativas funciona. Os vidros são espelhados, impossibilitando que alguém de fora o veja pedindo socorro. À prova de som, seus gritos são em vão, já que ninguém consegue ouvi-lo.
A cada tentativa frustrada de escapar, Ciro se machuca ainda mais, baleando sua própria perna, cortando profundamente o braço, entre outras situações que tornam sua experiência cada vez mais dolorosa e desesperadora. Contudo, o sofrimento de Ciro não é suficiente para satisfazer Enrique, que, de longe, monitora os movimentos do jovem e busca formas ainda mais brutais de puni-lo. Uma dessas torturas é ligar o ar-condicionado na temperatura mínima por horas, quase provocando uma hipotermia em Ciro. Além disso, a fome e a sede agravam seu estado de saúde à medida que os dias passam. Por vários dias, ele permanece preso no veículo, até que ocorre um confronto final entre ele e Enrique.
A premissa de “4×4” lembra, de certa forma, ao enredo do suspense brasileiro “Propriedade”, tanto por expor situações de violência comuns na América Latina quanto por se passar quase inteiramente dentro de um carro, com seus protagonistas aprisionados. Contudo, há diferenças importantes. Em “Propriedade”, a esposa de um proprietário rural se refugia em seu carro blindado como forma de se defender de um grupo de trabalhadores rurais revoltados. Já em “4×4”, Ciro, que representa a parcela desfavorecida da sociedade, fica preso acidentalmente em um carro com segurança máxima, tornando-se alvo das ações premeditadas de um justiceiro sádico.
Neste thriller argentino, o público se vê constantemente oscilando entre os dois lados, ora apoiando Ciro, ora torcendo por Enrique. O filme desafia nosso senso de justiça, fazendo-nos refletir sobre o que é realmente justo. Afinal, Ciro é uma vítima das desigualdades econômicas e sociais? É Enrique que age de forma distorcida em sua busca por justiça? Ou Enrique está apenas se defendendo da violência crescente e descontrolada comum das metrópoles? Cada minuto é carregado de tensão e, principalmente, provoca reflexão. Duprat e Cohn não entregam respostas; eles lançam perguntas, deixando ao espectador a tarefa de respondê-las.
Filme: 4×4
Direção: Mariano Cohn
Ano: 2019
Gênero: Crime/Thriller
Nota: 9