Adaptação cinematográfica de jogo com mais de 200 milhões de fãs no mundo todo está na Netflix Divulgação / 20th Century Fox

Adaptação cinematográfica de jogo com mais de 200 milhões de fãs no mundo todo está na Netflix

Talvez esteja próximo o dia em que tecnologias e instituições assumirão o controle sobre nossos pensamentos e escolhas, prevenindo-nos de agir inadequadamente antes mesmo de termos plena consciência. “Assassin’s Creed” explora essa ideia ao mergulhar em um conceito complexo demais para as suas aparentes pretensões. Dirigido por Justin Kurzel, o filme absorve a essência da popular franquia de videogames, na qual o jogador avança entre fases ao derrotar inimigos de diferentes épocas e realidades.

Esses antagonistas, no entanto, não se limitam às ameaças tangíveis; são símbolos das contradições da vida e dos dilemas relacionados ao poder de escolha, uma das poucas liberdades verdadeiramente inalienáveis que o ser humano possui. A narrativa acompanha um grupo de guerreiros conhecidos como Assassinos, cujo nome, apesar da conotação negativa, é reformulado para despertar uma curiosa admiração pela resistência ao controle e à submissão.

No universo do filme, a Ordem dos Templários está em busca da lendária Maçã do Éden, um artefato que contém a chave para o livre-arbítrio. A posse desse objeto concederia a qualquer governante o controle absoluto sobre as nações, permitindo a manipulação de orçamentos trilionários e transformando civilizações em prisioneiras de um domínio eterno. Ao longo de séculos, os Assassinos se opõem a essa busca. Sua missão: lutar contra o status quo e impedir que o poder da Maçã caia em mãos erradas, uma premissa que, no jogo, é muito mais clara do que na versão cinematográfica.

No contexto da Andaluzia do final do século 15, liderados por Aguilar, uma figura enigmática que personifica o conhecimento e a resistência, o grupo enfrenta a opressão dos poderosos de sua era. O enredo, entretanto, não se limita a uma única linha temporal: a história salta para o presente, onde Cal Lynch, um prisioneiro no corredor da morte, é resgatado pelos Templários, não por compaixão, mas por motivos muito mais sinistros. Interpretado por Michael Fassbender, Lynch é descendente direto de Aguilar, e sua genética é a chave para conectar o presente ao passado, abrindo caminho para a descoberta da Maçã do Éden.

O roteiro, assinado por Adam Cooper, Bill Collage e Michael Lesslie, desenvolve uma trama que vai além da mera batalha entre facções. Alan Rikkin, vivido por Jeremy Irons, é o presidente da corporação Abstergo, e sua obsessão pela Maçã motiva cada um de seus atos. Ele vê nesse artefato uma oportunidade de moldar o futuro à sua maneira, tornando-se o arquiteto de um mundo onde a desobediência e a liberdade de pensamento seriam suprimidas para sempre. Ao seu lado está a doutora Sophia (Marion Cotillard), que, com uma frieza quase sociopata, compartilha dessa visão distorcida de controle.

Embora o filme não se leve a sério em diversos momentos — algo que o próprio Kurzel parece reconhecer — ele preserva o charme exagerado e quase farsesco do jogo. A grandiosidade gráfica é um de seus maiores triunfos, com sequências de ação bem coreografadas e ambientações visualmente deslumbrantes que remetem diretamente à experiência do videogame. Mais do que um exercício de reflexão filosófica, “Assassin’s Creed” oferece um entretenimento visualmente impecável. A jornada delirante proposta pelo filme, apesar de ser previsível em alguns momentos, cumpre seu papel ao transportar o público para um universo onde as linhas entre realidade e fantasia se confundem, garantindo uma experiência imersiva.

A trama pode não ser um épico do pensamento crítico, mas sua força reside no espetáculo visual e na habilidade de Fassbender e Cotillard de manterem o espectador investido. É um filme que, assim como o jogo, não pretende resolver os dilemas profundos que aborda, mas oferece uma porta de entrada para reflexões sobre o livre-arbítrio e a luta constante pelo controle do destino humano.


Filme: Assassin’s Creed
Direção: Justin Kurzel
Ano: 2016
Gêneros: Ação/Aventura
Nota: 7/10