A série da Netflix mais assistida no mundo na atualidade Divulgação / Netflix

A série da Netflix mais assistida no mundo na atualidade

A diferença de 24 anos entre Gabriella e Elia, os protagonistas de “Amor Traiçoeiro” é o que menos conta ao longo dos seis capítulos da minissérie, uma história tola sobre como subir na vida sem fazer esforço — contando com a ingenuidade e a frágil autoestima alheias. A adaptação de “O Golpe do Amor” (2019), minissérie exibida pela BBC One, mais parece um dramalhão mexicano dos mais cafonas, em que até a paradisíaca Costa Amalfitana é arruinada por cenários bidimensionais e uma fotografia sobrecarregada nos tons terrosos e alaranjados, talvez exatamente para disfarçar a indigência da trama. O tiro sai pela culatra, e resta a um ou outro ator salvar o diretor Pappi Corsicato do desastre completo, numa narrativa melancolicamente arrastada, em que fica óbvia a falta de convicção do elenco.

Gabriella, dona de um hotel em reformas no sul da Itália, comemora seu sexagésimo aniversário num almoço com os filhos, a nora, o ex-marido e a neta, que lhe presenteia com um corgi. No fim da noite, sai para uma caminhada com o cachorro e alguns metros à frente vê um carro com a porta aberta. Ela pede um guincho para ele, uma chuva torrencial se aproxima, e então os dois vão até o hotel, onde conversam amenidades e a anfitriã empresta a seu hóspede involuntário uma camiseta do filho caçula que mora lá com ela. Não, este não é o começo de nada, e assim Elia, aquele estranho perturbador, vai tomar uma cerveja num inferninho ali perto, onde conhece Nico, o dono da camiseta cuja estampa não identifica (era do Sex Pistols). Minutos depois, eles se beijam, menos por desejo que por farra. Acredite: essa é uma das cenas mais estimulantes em “Amor Traiçoeiro”.

Elia continua a perseguir Gabriella, e apesar de todas as evidências desfavoráveis, os dois engatam um romance que não chega a ser combatido com o devido empenho por Stefano, o primogênito, por razões que Corsicato não tarda a esclarecer. A pouca afinidade entre Monica Guerritore e Giacomo Gianniotti só não é mais constrangedora que a canastrice de Francesco Del Gaudio como Nico, em aparições quase sempre dispensáveis. Aliás, os tipos de fato interessantes são tragados pelo clichê, embora nas raras vezes em que tem a chance, Emanuel Caserio confira a seu personagem nuances de um espírito atormentado por medos que ele faz questão de alimentar. Na conclusão, o diretor tenta reduzir os danos chamando ao palco Marina, a amante de Elia interpretada por Denise Capezza; contudo, a vontade de agradar a plateia com um final politicamente correto e falsamente progressista confirma a sensação inicial de que “Amor Traiçoeiro” não passa de uma pregação para donas de casa insatisfeitas com seus casamentos e seu cotidiano monótono. Na vida como ela é, sabemos, não é assim que a banda toca.


Série: Amor Traiçoeiro
Direção: Pappi Corsicato 
Ano: 2024
Gêneros: Drama/Romance 
Nota: 6/10

Giancarlo Galdino

Depois de sonhos frustrados com uma carreira de correspondente de guerra à Winston Churchill e Ernest Hemingway, Giancarlo Galdino aceitou o limão da vida e por quinze anos trabalhou com o azedume da assessoria de políticos e burocratas em geral. Graduado em jornalismo e com alguns cursos de especialização em cinema na bagagem, desde 1º de junho de 2021, entretanto, consegue valer-se deste espaço para expressar seus conhecimentos sobre filmes, literatura, comportamento e, por que não?, política, tudo mediado por sua grande paixão, a filosofia, a ciência das ciências. Que Deus conserve.