Apontado como 11º melhor filme da história do cinema pelo IMDb, épico com Tom Hanks levou 6 Oscars e está na Netflix Divulgação / Paramount Pictures

Apontado como 11º melhor filme da história do cinema pelo IMDb, épico com Tom Hanks levou 6 Oscars e está na Netflix

Pode ser que o cinema contemporâneo tenha perdido espaço para filmes como “Forrest Gump — O Contador de Histórias”, uma obra que transita entre o real e o fantástico, desenhando uma jornada que reflete tanto os sonhos mais sinceros quanto as fantasias mais insanas de um homem deslocado. Desde cedo, Forrest percebeu que jamais se adequaria ao mundo ao seu redor, que pouco ou nada lhe despertava emoção genuína. Com isso, ele se refugiou em um universo vasto e particular, criado com precisão, onde encontrou o escárnio de muitos, mas também uma forma de existir.

Esse filme é o resultado de uma harmonia perfeita entre o roteiro magistral de Eric Roth e Winston Groom, a direção visionária de Robert Zemeckis e o trabalho primoroso da equipe de efeitos especiais liderada por Allen Hall. Tudo isso, é claro, amparado por um elenco que trouxe ao mundo um dos personagens mais inesquecíveis da história do cinema. Tom Hanks, já uma estrela consolidada em 1994, quando o filme foi lançado, assume o papel de Forrest com uma entrega que transcende a atuação comum. Ele se apropria do personagem de forma única, imergindo completamente na pele de um homem cuja humanidade ressoa em cada espectador, lembrando-nos de que todos temos um lado Forrest que reprimimos ao longo da vida.

Forrest Gump atravessa as décadas e se insere nos eventos mais marcantes da história dos EUA entre os anos 1950 e 1980. Há uma insinuação de que ele seria um parente distante de Nathan Bedford Forrest, general confederado e líder da Ku Klux Klan no pós-Guerra Civil. Embora essa conexão passe quase despercebida, ela oferece uma camada a mais para compreender o personagem. Forrest Gump é um enigma, um homem com uma capacidade quase sobre-humana de absorver informações, mas que, paradoxalmente, não processa nenhuma delas com profundidade.

Desde as primeiras cenas, fica evidente o desconforto que Forrest provoca nas pessoas ao seu redor. A enfermeira negra que compartilha o banco com ele enquanto esperam o ônibus 9 inicialmente exibe nojo e medo, mas, aos poucos, sua percepção muda. A atriz Rebecca Williams, com sutileza, transmite a transformação de sua personagem — de desprezo à empatia silenciosa, até o momento em que sua condução chega e ela desaparece. Nem o roteiro nem a direção se aprofundam na possível condição de autismo de Forrest, talvez pela falta de conhecimento sobre o tema na época ou pelo desejo de focar em outros aspectos. A relação com sua mãe, no entanto, é explorada de forma pungente. Sally Field, em uma atuação poderosa, eleva ainda mais a performance de Hanks, interpretando uma mãe que se sacrifica de maneiras extremas para garantir uma vida digna ao filho.

À medida que a narrativa avança, Zemeckis propõe diversas explicações para o desenvolvimento social peculiar de Forrest. No Vietnã, ele forma uma amizade com Bubba, um soldado negro interpretado por Mykelti Williamson. A deficiência física de Bubba não o impede de lutar, mas ele acaba morrendo durante uma missão. Assim como Sally Field, Williamson traz uma camada emocional significativa ao filme, complementando a jornada de Forrest. Com flashbacks e cenas que inserem Forrest em momentos icônicos da história, o filme conecta o protagonista a figuras como Elvis Presley e John Lennon, sugerindo que ele é uma espécie de observador crítico de um tempo que não estava pronto para ele.

Forrest Gump, com todas as suas limitações, corre em direção ao seu destino em um mundo que talvez nunca consiga compreendê-lo por completo. E talvez o cinema nunca mais consiga repetir a mágica dessa narrativa única.


Filme: Forrest Gump — O Contador de Histórias
Direção: Robert Zemeckis
Ano: 1994
Gêneros: Drama/Comédia/Fantasia 
Nota: 10