Identificar um filme de grande potencial no mundo cinematográfico é uma tarefa que raramente segue uma fórmula exata. “O Paciente Inglês” ilustra perfeitamente essa imprevisibilidade, começando com inúmeras dificuldades e incertezas financeiras. Inicialmente sob a tutela da Fox, o projeto foi transferido para a Miramax após divergências com o diretor Anthony Minghella. A discórdia surgiu em torno da escolha de Kristin Scott Thomas para um papel de destaque, enquanto o estúdio preferia a popular Demi Moore.
Além dessa disputa, Bruce Willis foi cotado para interpretar Caravaggio, um personagem chave. No entanto, seu agente aconselhou a recusa do papel, decisão que se revelou um grande equívoco. “O Paciente Inglês” não apenas conquistou os críticos, mas também faturou dez vezes o valor investido e garantiu nove prêmios Oscar. O arrependimento de Willis foi tanto que ele demitiu seu agente após o sucesso estrondoso do filme.
Adaptado do romance homônimo de Michael Ondaatje, publicado em 1992, o longa foi lançado quatro anos depois. Ondaatje, escritor nascido no Sri Lanka e residente no Canadá, criou uma obra literária que se destaca pela complexidade e profundidade. O filme, uma transposição épica dessa narrativa, entrelaça histórias e personagens de maneira intrincada, culminando em um final que costura todos os pontos de forma poderosa e arrebatadora.
A história começa com um acidente aéreo no deserto do Saara. A bordo, dois passageiros cujas identidades são inicialmente desconhecidas. O sobrevivente, Almásy (Ralph Fiennes), revela-se gradualmente como o piloto da aeronave. A trama se desenrola em múltiplas camadas temporais, com foco principal em Hana (Juliette Binoche), uma enfermeira que cuida de feridos durante a Segunda Guerra Mundial. Ela, profundamente abalada pela perda de seu noivo e de uma amiga enfermeira, acredita estar destinada a ver todos os que ama morrerem.
Hana decide cuidar de Almásy, um homem gravemente queimado e sem memória de seu passado. Juntos, eles encontram abrigo em um mosteiro abandonado na Itália devastada pela guerra, onde ela monta uma enfermaria improvisada para cuidar do paciente enigmático. Com o tempo, descobre-se que Almásy não é o “paciente inglês” que todos presumem, mas sim László Almásy, um explorador e cartógrafo húngaro que participava de expedições arqueológicas organizadas pela Royal Geographical Society.
O enredo revela o envolvimento de Almásy em um romance proibido com Katherine Clifton, esposa de Geoffrey, outro membro da expedição. Esse relacionamento ilícito, iniciado durante a documentação de pinturas rupestres no Egito, acaba se deteriorando por medo de serem descobertos. As lembranças do piloto são desencadeadas por um exemplar de “Histórias de Heródoto”, um livro que ele carrega consigo, repleto de anotações e fotografias. Enquanto cuida dele, Hana enfrenta seus próprios conflitos internos, dividida entre o cuidado ao paciente e sua crescente atração por Kip, um sapador do exército britânico de origem indiana.
Simultaneamente, Caravaggio, agente da inteligência canadense, entra na história buscando vingança pelo homem que o entregou aos nazistas, o que resultou em sua captura e tortura. As tramas interligadas dos personagens tecem uma narrativa rica e complexa, culminando em um desfecho profundamente tocante.
“O Paciente Inglês” foi um marco no cinema, não apenas por sua narrativa envolvente, mas também pela cinematografia impecável de John Seale, que lhe rendeu um Oscar. O visual do filme, caracterizado pelas vastas paisagens desérticas, amplifica a intensidade emocional de cada cena. A técnica do chiaroscuro, utilizada com precisão, infunde uma atmosfera lírica, permitindo que cada frame ressoe com profundidade.
A atenção aos detalhes, a construção multifacetada dos personagens e as atuações extraordinárias do elenco transformaram “O Paciente Inglês” em uma obra-prima. Mesmo após décadas de seu lançamento, o filme, disponível na Netflix, continua a cativar e envolver novas gerações, reafirmando sua relevância e impacto no cenário cinematográfico.
Filme: O Paciente Inglês
Direção: Anthony Minghella
Ano: 1996
Gênero: Romance/Drama
Nota: 10