Casar é como apostar no imprevisível. O amor verdadeiro, por vezes até exacerbado, entre um homem e uma mulher não garante uma vida plena, tranquila ou estável. É uma construção que demanda tempo, reflexão e compreensão, elementos que se transformam em alicerces sólidos para o que poderia ser eterno. Entretanto, o mesmo sentimento, com o passar dos anos, pode se tornar uma fonte de conflitos, à medida que sua essência se altera e o casal perde a capacidade de entendê-lo.
Em “Blue Valentine”, Derek Cianfrance explora essa complexidade a partir da trajetória de Dean e Cindy, personagens cujos erros e escolhas trazem à tona a imaturidade e pressa em sacramentar um amor intenso. A relação entre eles, embora movida por uma paixão genuína, carecia da profundidade necessária para sobreviver ao desgaste do cotidiano. O roteiro aborda de maneira franca como essa mesma paixão se revela tanto o maior triunfo quanto a raiz da dissolução de um relacionamento que, de tão idealizado, não encontrou meios de evoluir.
O longa desafia o famoso “mito dos sete anos”, questionando a noção de que há um período crítico no qual casais enfrentam turbulências inevitáveis. Cianfrance não se prende a fórmulas ou previsões; ao contrário, desconstrói essa lógica estatística com um olhar mais humano e íntimo sobre as falhas do amor. Não é possível prever, com números ou padrões, quando um casamento enfrentará suas maiores provações. A ideia de que o relacionamento atinge um ciclo de crise após alguns anos de união é apenas uma convenção, um número que se associou ao místico, mas que não dita regra alguma.
Com uma narrativa que desconstrói idealizações e explora os nuances das relações, o filme permite que o público enxergue além das aparências. Tanto Gosling quanto Williams entregam performances densas, que revelam a transformação de seus personagens ao longo da trama. A mudança física e emocional dos dois é clara, e, ainda que os conflitos possam parecer íntimos, refletem as questões universais de qualquer relacionamento.
Dean e Cindy não são apenas vítimas do tempo ou das circunstâncias, mas também de suas próprias limitações e decisões. O longa faz um retrato cru da dificuldade de manter viva a chama do amor diante das responsabilidades que surgem com a vida em comum, como a chegada de filhos e o peso do cotidiano. Eles, como tantos outros casais, enfrentam o dilema entre seguir juntos ou reconhecer que o amor, tal como era no início, já não existe mais.
O diretor escolhe deixar de lado tragédias clássicas para a dissolução de uma relação, como doenças ou acidentes, e foca no desgaste natural que o tempo impõe aos sentimentos. O que começou com fogos de artifício e promessas de um futuro radiante acaba se transformando em uma convivência dolorosa, onde o amor, outrora vibrante, se esvai aos poucos. Isso é o cerne da história contada por Cianfrance: o retrato de um sentimento que, mesmo nascendo forte, pode não resistir às provas impostas pela vida.
Filme: Blue Valentine
Direção: Derek Cianfrance
Ano: 2011
Gênero: Romance/Drama
Nota: 9/10