Suspense psicológico argentino com 100% de avaliações positivas está na Netflix — e você não sabia! Divulgação / Cimarron Cine

Suspense psicológico argentino com 100% de avaliações positivas está na Netflix — e você não sabia!

Há uma tendência crescente em fomentar uma rivalidade entre o cinema argentino e o brasileiro, uma comparação que se mostra, na verdade, pouco pertinente, já que a produção de nossos vizinhos se encontra em um estágio muito mais avançado, em todos os sentidos. “La Misma Sangre” é mais uma prova incontestável dessa realidade.

Dirigido pelo argentino Miguel Cohan, o longa destaca, de maneira incisiva, a clara distinção entre a ampla compreensão que eles têm do meio cinematográfico e a concepção ainda limitada que temos sobre o que se considera bom cinema. Embora o Brasil tenha cineastas que, com grande esforço, aprenderam o que significa fazer um filme, a diferença de abordagem ainda é perceptível. Glauber Rocha, cineasta baiano reconhecido por sua capacidade de, com simplicidade e talento, produzir obras de impacto, é uma rara exceção no panorama nacional. Muito antes de ser reverenciado como um dos maiores nomes do cinema nacional, Glauber já mostrava, desde os seus primeiros curtas, uma busca incessante por uma linguagem própria que o distinguiria.

Não é frequente que o cinema brasileiro alcance o mesmo nível de destaque, embora, vez ou outra, produza filmes de grande valor. Exemplos recentes, como “O Lobo Atrás da Porta”, de Fernando Coimbra, que revisita o trágico caso da Fera da Penha, e “O Outro Lado da Rua”, de Marcos Bernstein, protagonizado por Fernanda Montenegro e Raul Cortez, são demonstrações desse potencial. Mas voltemos ao foco.

“La Misma Sangre”, lançado em 2019, utiliza um dos pilares do drama portenho para manter a trama coesa até o fim, sendo este um de seus grandes méritos. Oscar Martínez, sempre constante em suas atuações, mais uma vez entrega uma performance sólida, interpretando Elías, que, após a morte do pai, se vê responsável pelos negócios da família. Elías, no entanto, deseja mais do que a herança de um simples comércio de queijos e, na ânsia por expandir, acaba se endividando. Sua única saída é convencer sua esposa, Adriana, a ajudá-lo financeiramente. Adriana, interpretada por Paulina García, é categórica em sua negativa, ressaltando o distanciamento emocional entre os dois, o que não impede Elías de seguir com seus planos.

A tensão entre o casal se desenrola em uma cena sutil, mas carregada de significado. Durante uma discussão na cozinha onde Adriana prepara seus quitutes, um acidente trágico ocorre: o colar da mulher fica preso em uma máquina, e Elías, impassível, a deixa morrer. Para ele, a morte da esposa representa a única chance de saldar suas dívidas, através do dinheiro do seguro de vida.

A partir desse ponto, o filme se transforma em um complexo jogo de intrigas, com Santiago, genro de Elías, começando a suspeitar do envolvimento do sogro na morte de Adriana. Apesar das tensões familiares, é impossível ignorar o elo que, por mais frágil, une os personagens. Santiago, movido pela suspeita, mergulha numa investigação particular, enquanto Carla, sua esposa e filha de Elías, tenta equilibrar a lealdade familiar com a desconfiança crescente.

Com o desenrolar dos acontecimentos, Cohan constrói uma narrativa em que cada personagem é, de certa forma, prisioneiro de suas próprias escolhas. A conclusão do filme evidencia a tragédia que os une, cada um marcado por sua própria condenação. “La Misma Sangre” reforça o vigor do cinema argentino, que, mesmo partindo de argumentos tradicionais, consegue inovar e surpreender, destacando-se como uma aula de como fazer um filme eficaz e envolvente, algo que até Glauber Rocha, com seu olhar crítico, certamente admiraria.


Filme: La Misma Sangre
Direção: Miguel Cohan
Ano: 2019
Gênero: Suspense
Nota: 9/10