Suspense francês surpreendente, baseado em graphic novel de sucesso, está na Netflix e vai fazer seu cérebro dar tilt Divulgação / Netflix

Suspense francês surpreendente, baseado em graphic novel de sucesso, está na Netflix e vai fazer seu cérebro dar tilt

As famílias, com suas complexidades inatas, recorrem a uma infinidade de artifícios para manterem-se unidas, muitas vezes atravessando fronteiras emocionais que desafiam a razão. Cada integrante traz consigo suas particularidades — gostos, traumas e manias — que, combinados, podem desencadear uma série de comportamentos insólitos. Esse turbilhão emocional frequentemente escapa do controle e se espalha pelo futuro, levando consigo uma carga de delírio que parece irreversível.

À medida que a deterioração emocional avança, suas consequências vão além do presente, enraizando-se profundamente nas vidas daqueles envolvidos. O resultado? Um ciclo de hipocrisia e vícios que contamina tudo ao redor, até que cada aspecto da convivência familiar esteja impregnado de falsidade, impedindo qualquer tentativa de regeneração, enquanto a verdade espera pacientemente por uma oportunidade de se manifestar.

O tempo, nesse contexto, desempenha um papel ambíguo: ora cura, ora agrava as feridas das relações humanas. A maneira como lidamos com nossos desafios emocionais define os caminhos que seguiremos rumo à felicidade, um objetivo muitas vezes sabotado por negligências e escolhas mal feitas. Velhos fantasmas, memórias de situações que ocorreram há muito tempo, com pessoas que já não somos mais, frequentemente reaparecem nos momentos de maior fragilidade, colocando-nos à prova.

Nessas ocasiões, é preciso encontrar forças em um lugar que desconhecemos para seguir em frente e, quem sabe, encontrar uma nova perspectiva para a vida — algo que nem sempre se concretiza. No entanto, o mistério de “O Paciente Perdido” raramente é o que aparenta ser. A narrativa, por sua vez, se desenrola inicialmente de maneira dispersa, até que assume um formato mais coeso, marcado por cenas bem construídas que intensificam a atmosfera de suspense. Christophe Charrier, o diretor, permite que o enredo se desenrole de forma quase autônoma, revelando gradualmente seus segredos.

Adaptado da graphic novel de Timothé Le Boucher e roteirizado por Charrier e Elodie Namer, “O Paciente Perdido” começa de forma surpreendentemente iluminada, contrastando drasticamente com o tom sombrio que domina o restante da trama. Essa cena inicial parece, de fato, fora de lugar, como se fizesse parte de uma história completamente diferente. Contudo, Charrier logo reconstrói o contexto, inserindo essa passagem em um quadro maior que, embora confuso no início, começa a ganhar clareza conforme as primeiras explicações surgem e o enredo se aprofunda.

O arco dramático, antes disperso, torna-se mais seco e contundente, à medida que os personagens principais emergem no centro da narrativa. O assassinato que serve como ponto de partida para o filme é gradualmente revelado como uma cena de brutalidade extrema, cujas vítimas incluem o pai, interpretado por Stéphane Rideau, a mãe, por Audrey Dana, e o primo, encarnado por Matthieu Lucci. No entanto, este último personagem esconde um segredo, um dos vários que a narrativa habilmente preserva até o momento oportuno.

Charrier guia o espectador através de uma trama cuidadosamente construída, deixando lacunas que só são preenchidas nos momentos finais, proporcionando uma experiência imersiva. O filme se destaca pela forma como delimita dois ambientes psicológicos distintos, refletidos em cenários opostos: o hospital, onde Thomas, interpretado por Txomin Vergez, está internado, recuperando-se de amnésia e dos traumas causados pela tragédia que dizimou sua família; e o espaço onde Laura, brilhantemente interpretada por Rebecca Williams, atua, justificando os horrendos assassinatos. A dinâmica entre esses dois ambientes é fundamental para a trama, proporcionando camadas de profundidade psicológica que conferem ao filme uma atmosfera quase claustrofóbica.

“O Paciente Perdido” traz elementos de mistério que lembram autores como Agatha Christie e Edgar Allan Poe, mas tem uma identidade própria. Embora Charrier, em alguns momentos, opte por ângulos mais amplos que poderiam ser melhor explorados, a obra se sustenta por sua habilidade de conduzir o espectador por uma montanha-russa emocional, mantendo-o sempre à beira do desespero, enquanto cada novo segredo é revelado.


Filme: O Paciente Perdido
Direção: Christophe Charrier
Ano: 2022
Gêneros: Drama/Mistério/Suspense
Nota: 8/10