Remake de 2024, da obra-prima de John Woo, no Prime Video, é um dos filmes mais assistidos do mundo atualmente

Remake de 2024, da obra-prima de John Woo, no Prime Video, é um dos filmes mais assistidos do mundo atualmente

Em 1989, os filmes de ação experimentaram uma diáspora. A partir daquele momento, começava uma nova era para as produções que se destacavam por mostrar o lado mais sombrio da natureza humana mediante a bestialidade que florescia em cenas de ritmo caótico, sem prejuízo do entendimento do filme como uma manifestação artística que visava também ao deleite estético, tudo isso mérito de John Woo, diretor de “The Killer — O Matador”. Trinta e cinco anos depois, quem aprecia histórias de andamento frenético, regadas a muito sangue e os lendários acertos de contas entre vilões e anti-heróis sujeitos a repensar a vida depois de um evento que de alguma forma os faz balançar, se esbalda com “The Killer”, tão bom e muito mais bonito que o original, a ponto de fazer com que o espectador despreze as incoerências e repetições do roteiro e acompanhe com vivo interesse os confrontos físicos e éticos de personagens que balançam sobre a corda bamba de uma existência atribulada, tentando manter uma sombra de dignidade ao passo que nunca serão os heróis que esperamos que sejam. O texto de Woo e dos corroteiristas Josh Campbell e Brian Helgeland resgata as passagens que entraram para a história do cinema no original, bancando mudanças supostamente anódinas, talvez alinhadas com a correção política, mas que não mexem com a força do enredo.

O desejo de reparação é sempre um excelente ponto de partida nas histórias sobre gente ávida por reencontrar seu próprio eixo. Há quem se perca pelos descaminhos que se vendem como um atalho para a felicidade, do mesmo modo que existem os que não se conformam com aquilo que todos julgam como o natural, e dessa luta emergem as tramas de sofrimento e resistência de que é feita a própria humanidade e conferem-lhe sentido. Depois de um prólogo onde aparece numa igreja de estilo neogótico de 252 anos, rodeada por vitrais desbotados e pombos atrevidos, Zee vaga pelas ruas de Paris até chegar à boate onde sua vida vai mudar para sempre. O diretor recorre a esses recursos visuais a fim de marcar a diferença entre seu primeiro longa e este, protagonizado por uma mulher jovem, mas igualmente perdida, talvez querendo dar um novo rumo a seu destino, malgrado não saiba de que jeito.

A sequência em que Zee encara uma quadrilha de mafiosos munida de uma espada de samurai e sem querer vitima Jennifer Clark, a cantora interpretada por Diana Silvers, embaralha seus planos, e o que se segue é uma mistura de pancadaria com sucessivos episódios de crise moral, bem-encarnados pelo desempenho mesmerizante de Nathalie Emmanuel. Autoconfiante, Emmanuel fica ainda melhor na companhia de Omar Sy, que na pele do detetive Sey reforça a ideia de um conto sobre espíritos verdadeiramente livres que anseiam por um porto seguro. Woo brinca com esse argumento, de modo a levar a história para um romance improvável, o que já acontecera em 1989, quando o assassino e o policial eram do mesmo gênero. Coragem de um cineasta que faz questão de preservar sua independência e sua rebeldia.


Filme: The Killer
Direção: John Woo
Ano: 2024
Gênero: Ação 
Nota: 9/10