Nós não amamos ninguém. Amamos a ideia que fazemos de alguém

Nós não amamos ninguém. Amamos a ideia que fazemos de alguém

Afinidade acontece. Dois signos de ar entrelaçados por livre e espontânea vontade numa madrugada de quarta-feira, a mesma frase dita ao mesmo tempo, “o All star azul que combina com o preto de cano alto”. Quando menos esperamos, o cupido bate à porta. E a gente, que já não esperava mais pela visita, passa um café e o convida para entrar.

Muitas vezes não é a igualdade que nos aproxima de alguém, senão algo que o outro tem e que nos falta por dentro. Pode ser a paz, a simplicidade, a fé, a alegria singela desenhada no sorriso. Eu duvido que as pessoas realmente se importem com a cor dos olhos… Bonito mesmo é o jeito que ele olha para ela, feito menino do interior quando vê o Papai Noel pela primeira vez. Ela esquece a pressa da cidade grande e pousa seus olhos nele, como casal de pássaros que assenta no ninho depois de uma longa viagem. Mesmo que eles não se pareçam e que mal se conheçam, ainda assim encontraram incontáveis semelhanças um no outro.

Estar apaixonado é entretecer a própria alma na alma de alguém. Estar apaixonado é sentir a presença de um corpo que está a quilômetros de distância do seu. Estar apaixonado é desejar estar perto de uma única pessoa no mundo inteiro. Estar apaixonado é querer dormir e acordar dentro de um mesmo abraço todos os dias. Estar apaixonado é inventar um dialeto que só os dois entendem. Estar apaixonado é perder o juízo e a noção do tempo, do espaço e, principalmente, do ridículo. Estar apaixonado é entregar o seu coração num buquê de expectativas, e claro, sentir-se ridículo por isso também.

Mas para que um casal dê certo, tanto faz se um é o focinho do outro. Temperamentos parecidos, quando não dão sono, acabam em tragédia. Melhor mesmo é quando os dois não se parecem tanto, e ao mesmo tempo, se afinam em quase tudo. Ainda que sejam diferentes, que ele ame a vida no campo e ela seja cria do asfalto, os dois decidem morar no Centro e passar os finais de semana na chácara. Curtem Nando Reis, vão à igreja todo domingo e querem dar a volta ao mundo dentro de um balão. Valores equivalentes e um punhado de afinidade são a fórmula certeira para uma história feliz.

Agora, se eles serão felizes para sempre depende de quanto durará a eternidade de cada um. Depende de suas entregas e recompensas, dos passos dados no mesmo ritmo e na mesma direção. Quiçá o medo dele se machucar seja agasalhado pela paciência dela, quem sabe uma alma carinhosa possa amaciar a aspereza de um coração bicho do mato. Eu sei que estranho mesmo seria se eles não se apaixonassem…

Karen Curi

é jornalista.