Comédia levinha na Netflix faz seus problemas desaparecerem por 91 minutos Divulgação / Netflix

Comédia levinha na Netflix faz seus problemas desaparecerem por 91 minutos

Casamentos podem durar o suficiente para que sejam inesquecíveis ou se tornar uma agonia sem fim, se arrastando até que um dos dois tenha a porção de coragem que equivalha aos conselhos dos outros e ponha, afinal, uma pedra sobre o defunto, com toda a civilidade. Cada um sabe onde lhe aperta o sapato e todos dispomos de uma espécie de sensor de autorrespeito, que começa a apitar incansavelmente quando uma relação dá sinais reiterados de que alguma coisa vai mal e é preciso tomar uma atitude. No caso dos protagonistas de “Tudo pelo Divórcio”, esse ciclo de abandono mútuo, mágoas desnecessárias, ciúme doentio e enfaro foi interrompido há duas décadas, e agora o ex-casal parece querer apagar o tempo que viveram juntos e voltar ao passado, como se a vida fosse um filme que se pode retroceder ao início sem nenhuma terrível consequência. Michał Chaciński e Radoslaw Drabik compõem mais um par de diretores a conseguir destaque na novíssima cena cinedramatúrgica da Polônia, e em hora e meia têm o condão de refazer a jornada de uma mulher e um homem em busca de plenitude, mas que escolhem a maneira mais arriscada para perseguir seus novos sonhos: repetindo os velhos erros.

Kinga e Jacek estão em outros relacionamentos, mas pararam no tempo. Daí a ideia fixa por uma certa anulação do matrimônio por tempo de divórcio, uma aberração teológica que, claro, a Igreja não contempla. O roteiro de Chaciński e Lukasz Swiatowiec explica a instabilidade emocional desses dois ex-apaixonados mostrando-os seus respectivos mundinhos. Kinga, regente de uma orquestra estudantil, divide seu cotidiano com o motorista de aplicativo bonachão interpretado por Tomasz Schuchardt, enquanto seu primeiro marido  também não tem nenhuma dificuldade em tocar seus novos afetos.

Magdalena Popławska e Wojciech Mecwaldowski se alternam do drama para a comédia sem muito esforço, malgrado a história balance num vaivém de euforia e placidez que compromete o andamento orgânico do enredo. Aqui, Chaciński e Drabik, produtores de “Planet Single” (2016), dirigido por Mitja Okorn, pesam a mão na graça pela graça, ainda que haja boas passagens de Popławska e Mecwaldowski juntos, honrando a arte de Andrzej Wajda (1926-2016), Krzysztof Kieslowski (1941-1996) e Roman Polanski, tão distintos entre si quanto talentosos, responsáveis por filmes engajados, líricos, provocadores, que sempre contestavam o estabelecido de algum modo, e não raro eram tachados de impróprios, imorais, abjetos. “Tudo pelo Divórcio” não chega a tanto, mas faz aquilo a que se propusera.


Filme: Tudo pelo Divórcio 
Direção: Michał Chaciński e Radoslaw Drabik
Ano: 2024
Gêneros: Drama/Comédia 
Nota: 7/10