Inspirado em Hitchcock, obra-prima no Prime Video traz uma das cenas mais icônicas da história do cinema de suspense Divulgação / Metro-Goldwyn-Mayer

Inspirado em Hitchcock, obra-prima no Prime Video traz uma das cenas mais icônicas da história do cinema de suspense

Brian De Palma é decerto o grande discípulo de Alfred Hitchcock (1899-1980) — sem que isso queira dizer que seus filmes sofram de qualquer transtorno de dupla identidade. Uma das provas é “Vestida para Matar”, uma história violenta, mas charmosa, capaz de prender o espectador pelos motivos “errados” enquanto se desenrola em enquadramentos quase mágicos, decisões estéticas plenas de sofisticação e personagens complexos, que não se furtam a tomar atitudes intempestivas, mas sempre plausíveis, o que leva obrigatoriamente à continuidade das ações brutais que se mantêm até o derradeiro instante. Em seu roteiro, De Palma distribui reviravoltas à Hitchcock, sabendo reservar espaço para um suspense metódico, progressivo, que vai desaguando em sequências feitas de mal-estar e paranoia, sensações de que o mais pacato dos homens pode falar com propriedade e convicção. O diretor lança mão desses elementos um tanto artificiosos a fim de despertar quem assiste para uma hipótese quase absurda, mas que ganha força no transcorrer dos 106 minutos.

“Vestida para Matar” começa como um thriller erótico centrado numa bela moradora de Manhattan de quarenta e poucos anos que visita um museu na hora do almoço à procura de sexo. Ela chama-se Katie Miller, e De Palma a segue em lances que tornam-se mais e mais parecidos com Hitchcock, até que vira a chave do suspense para o lúbrico, e investe em cada passo da mulher, que fita um cavalheiro alto, moreno e bonito a poucos metros. Ela o fita, quebra sua resistência, deixa cair a luva de propósito, e, finalmente, os dois começam a vibrar no mesmo diapasão, consumando sua volúpia no banco traseiro de um táxi. Algumas cenas adiante, ela está acordando de um profundo sono pós-coito, sai apressada, mas esquece a aliança de compromisso.

Muitos outros personagens entram no filme, porém, nesse primeiro contato do espectador com a trama, fica clara a intenção diversionista de De Palma, espalhando uma densa cortina de fumaça para que atenhamo-nos aos dotes de Angie Dickinson e deixemos de lado o que importa. Robert Elliott, o psiquiatra vivido por Michael Caine, trata dois brilhantes tipos menores, ao passo que Liz Blake, a adorável prostituta de Nancy Allen, é tragada para centro das investigações dos homicídios em série que justificam o longa por uma razão tragicômica. Na outra ponta, Peter Miller, um jovem nerd intrigado com um detalhe do temperamento do criminoso, desenvolve um expediente quase revolucionário para fundamentar suas suspeitas, e Keith Gordon tem seu tempo de destaque. “Vestida para Matar” — e Brian De Palma, por extensão — são isso: um Hitchcock menos pretensioso e mais insinuante, em que evidências têm o mesmo peso que a verdade.


Filme: Vestida para Matar
Direção: Brian De Palma
Ano: 1981
Gêneros: Drama/Suspense 
Nota: 8/10