Com 34 indicações a prêmios, incluindo 5 Emmys, série com Reese Witherspoon é a melhor do Prime Video Divulgação / ABC Signature

Com 34 indicações a prêmios, incluindo 5 Emmys, série com Reese Witherspoon é a melhor do Prime Video

A série “Pequenos Incêndios por Toda Parte”, adaptada pela Hulu e transmitida pelo Prime Video, é baseada no best-seller de Celeste Ng e aborda com profundidade as relações entre mães, filhas e o impacto das escolhas individuais em seus contextos familiares. A trama começa de forma intrigante, com um incêndio devastador na casa de Elena, uma das protagonistas, interpretada por Reese Witherspoon. Logo de início, fica claro que o fogo, tanto literal quanto metafórico, é um elemento central que permeia o enredo, refletindo conflitos internos e tensões sociais.

Elena representa um modelo de mulher branca, de classe média alta, que vive uma vida superficialmente perfeita. Jornalista bem-sucedida, ela tem quatro filhos com seu marido advogado, mas a aparente harmonia familiar é corroída por insatisfações e distanciamentos, principalmente com sua filha mais nova, Izzy, que se destaca como uma ovelha negra no seio da família. Essa dinâmica familiar disfuncional é uma das principais linhas narrativas que revelam camadas de ressentimento e expectativas sufocantes.

Por outro lado, Mia Warren, interpretada por Kerry Washington, é o oposto de Elena em quase todos os aspectos. Negra, artista, mãe solteira e de condição financeira precária, Mia e sua filha, Pearl, vivem uma vida itinerante e cheia de incertezas. Embora o relacionamento entre Mia e Pearl pareça inabalável, há um segredo no passado de Mia que paira sobre sua vida, criando um clima constante de tensão e mistério. A narrativa habilmente constrói essa atmosfera de desconfiança e curiosidade, enquanto vai desvendando aos poucos o que realmente se esconde por trás de sua aparente fortaleza emocional.

A interação entre Elena e Mia é complexa e multifacetada. Enquanto, em momentos, há uma conexão que parece surgir da experiência compartilhada da maternidade, também há uma tensão racial e de classe subjacente que molda suas interações. A aparente benevolência de Elena ao tentar ajudar Mia pode ser vista como uma tentativa de reafirmar sua superioridade social e moral, enquanto Mia, com seu comportamento reservado, desconfia dessa caridade, sempre mantendo uma distância emocional. Esse conflito sutil revela a ambiguidade moral das personagens, que fogem de estereótipos maniqueístas, oferecendo um retrato mais realista da complexidade humana.

A série explora com maestria temas relevantes e contemporâneos como racismo, desigualdade social, expectativas familiares e a rivalidade disfarçada de cumplicidade entre mulheres. Esses temas, tratados com nuance e profundidade, refletem questões amplamente discutidas na sociedade atual, especialmente nas redes sociais, e fazem da série uma obra reflexiva e provocativa.

Comparações com “Big Little Lies” são inevitáveis, especialmente pelo fato de ambas as séries colocarem em evidência a vida de mulheres em circunstâncias privilegiadas, mas cercadas de segredos e dilemas morais. “Pequenos Incêndios por Toda Parte”, no entanto, vai além ao abordar não apenas os dramas pessoais, mas também a intersecção entre raça, classe e gênero, criando uma narrativa mais diversa e rica em nuances.

À medida que os episódios avançam, o suspense aumenta, com segredos sendo revelados e reviravoltas que mantêm o espectador à beira do assento. A série não oferece respostas fáceis, mas sim um olhar multifacetado sobre a condição humana, onde cada personagem é tanto vítima quanto algoz de suas próprias circunstâncias. Essa dualidade, a capacidade de ser bom e mau ao mesmo tempo, é o que torna a série tão envolvente e relevante.


Série: Pequenos Incêndios por Toda Parte
Criação: Liz Tigelaar
Ano: 2020
Gênero: Thriller/Drama
Nota: 10

Fer Kalaoun

Fer Kalaoun é editora na Revista Bula e repórter especializada em jornalismo cultural, audiovisual e político desde 2014. Estudante de História no Instituto Federal de Goiás (IFG), traz uma perspectiva crítica e contextualizada aos seus textos. Já passou por grandes veículos de comunicação de Goiás, incluindo Rádio CBN, Jornal O Popular, Jornal Opção e Rádio Sagres, onde apresentou o quadro Cinemateca Sagres.