O filme “Rastros de um Sequestro” é uma teia psicológica intrincada, narrada sob a perspectiva de um protagonista cujo olhar sobre os fatos é, no mínimo, duvidoso. Esse enredo desorientador faz com que o público siga uma trajetória que muda tão drasticamente que, ao final, é difícil acreditar que o início e o fim pertencem à mesma história.
Dirigido pelo cineasta coreano Hang-jun Jang, a ideia para o filme tomou forma de maneira casual, mas curiosa. Durante um encontro natalino, Jang conversava com amigos, quando um deles contou que seu primo havia desaparecido por um mês. Ao retornar, parecia outra pessoa, como se tivesse sido substituído por um sósia. Essa peculiaridade levou Jang a brincar com a ideia: “Será que ele realmente voltou?”. Desse ponto em diante, a imaginação foi alimentada, e a premissa de “Rastros de um Sequestro” começou a tomar vida.
No centro da trama está Jin-seok, vivido por Kang Ha-neul. O jovem estudante faz parte de uma família aparentemente comum, que se muda para uma casa nova em um bairro tranquilo. Ele divide o quarto com seu irmão mais velho, Yoo-seok (Mu-Yeol Kim), uma situação temporária, já que um dos quartos da casa ainda guarda pertences do antigo proprietário. Apesar do cenário doméstico idealizado, o filme começa a instigar uma tensão logo de início. O quarto ocupado é estritamente proibido, e o ex-dono da casa exige que ninguém entre no cômodo. Essa proibição só intensifica a curiosidade de Jin, que se sente atraído pelo quarto, ouvindo ruídos estranhos que despertam sua inquietação.
A atmosfera de mistério cresce quando, em uma noite chuvosa, Yoo-seok é violentamente sequestrado por homens desconhecidos e levado em uma van preta. Seu desaparecimento dura 19 dias, e quando ele finalmente retorna, algo está visivelmente errado. Ele afirma não se lembrar de nada, mas sua mudança de comportamento é inegável. Jin, observador atento, percebe que o irmão está diferente — até o jeito de mancar trocou de perna. Ao ser questionado, Yoo-seok constantemente faz Jin duvidar de sua própria sanidade, insinuando que o jovem está confundindo sonhos com a realidade. O público é arrastado para esse jogo psicológico de manipulação, conhecido como “gaslighting”, onde as certezas do protagonista — e do próprio espectador — são questionadas repetidamente.
Conforme o enredo avança, o suspense só aumenta. Reviravoltas inesperadas jogam a audiência em direções inesperadas, misturando o real com o sobrenatural de maneira engenhosa. O filme, que começa como um thriller psicológico, transcende gêneros, e sua narrativa inteligente mantém o público imerso, enquanto a linha entre o que é verdade e o que é ilusão se desfaz.
“Rastros de um Sequestro” é uma trama que desafia o espectador a adivinhar o próximo movimento, mas sempre o surpreende. Sua construção cuidadosa, que mescla o suspense com elementos sobrenaturais, cria uma experiência cinematográfica que prende a atenção, forçando quem assiste a reavaliar, a cada novo detalhe, o papel de mocinhos e vilões. Esse filme, uma joia do cinema coreano, é um exercício de sofisticação e originalidade que merece ser descoberto e admirado.
Filme: Rastros de um Sequestro
Direção: Hang-jun Jang
Ano: 2017
Gênero: Policial/Mistério/Suspense
Nota: 9/10