Considerado um dos melhores suspense ds últimos 3 anos, filme arrecadou 10 vezes o próprio orçamento e está na Netflix Divulgação / Hammerstone Studios

Considerado um dos melhores suspense ds últimos 3 anos, filme arrecadou 10 vezes o próprio orçamento e está na Netflix

“Noites Brutais”, dirigido e roteirizado por Zach Cregger, é um filme que carrega em si uma narrativa de terror única, que se distingue das adaptações literárias comuns no gênero. Embora o enredo não seja extraído diretamente de um livro, a inspiração de Cregger veio após a leitura de “The Gift of Fear”, de Gavin de Becker.Este best-seller é amplamente reconhecido por ensinar mulheres, adolescentes e crianças a identificarem sinais de perigo iminente e reagirem de maneira apropriada para evitar situações de violência. Motivado por essa obra, o diretor esboçou inicialmente um curta-metragem, onde uma mulher ignorava progressivos sinais de alerta. Contudo, ao desenvolver essa ideia, Cregger percebeu o potencial para algo maior e mais profundo, transformando o curta em um longa-metragem envolvente.

Apesar do roteiro intrigante, a caminhada até o cinema não foi fácil. O projeto enfrentou recusas de diversas produtoras, incluindo a renomada A24, antes de conseguir financiamento. Com um orçamento de 4,5 milhões de dólares, proveniente da 20th Century Fox, considerado modesto em termos de Hollywood, o filme não só foi realizado como também superou todas as expectativas. O desempenho nas bilheterias foi dez vezes superior ao investimento inicial, e o filme obteve elogios generalizados da crítica especializada, consolidando-se como um sucesso dentro do gênero.

O roteiro, à primeira vista, pode parecer simples, mas carrega camadas de significados. Cregger explora de forma sutil, mas contundente, como os verdadeiros monstros da sociedade não são criaturas sobrenaturais, mas sim os próprios homens. Nesse contexto, as mulheres são retratadas como aquelas que precisam, diariamente, lidar com uma realidade perigosa e opressora. Essa metáfora permeia toda a obra, intensificando a conexão entre o terror fictício e as dinâmicas de poder e violência do mundo real.

A protagonista, Tess, interpretada pela talentosa Georgina Campbell, chega a Brightmoor, um bairro desolado de Detroit, para uma entrevista de emprego. O ambiente, em uma noite chuvosa, já sugere uma atmosfera de tensão. Ao chegar à casa que alugou pelo Airbnb, ela se depara com a ausência das chaves.

A situação se complica quando Tess percebe que a casa já está ocupada por um outro hóspede, Keith (Bill Skarsgard). A princípio, ele parece suspeito, mas, após uma longa conversa, Tess decide confiar nele. É essa construção de confiança, em meio a um cenário repleto de incertezas, que dita o tom de suspense do filme.

Durante a madrugada, eventos estranhos começam a acontecer. A porta do quarto de Tess se abre sozinha, e barulhos ecoam pela casa. Keith, que parecia estar em um pesadelo, também se assusta com a situação. No entanto, o clima de perigo se intensifica no dia seguinte, quando Tess percebe o quão degradado está o bairro ao redor. Mesmo ciente de que a situação é estranha, ela resolve ficar, movida por uma inexplicável atração por Keith.

A tensão atinge novos níveis quando Tess, ao explorar o porão da casa, descobre um quarto assustador contendo apenas uma cama suja e uma câmera. A porta do porão se fecha, deixando-a presa até que Keith a liberte. Quando ele chega, Tess relata o que encontrou, e Keith decide investigar. Essa decisão leva ao desaparecimento dele, deixando Tess diante de um dilema: ignorar os eventos ou seguir seu instinto de ajudar o homem.

A revelação do porão é apenas o começo dos horrores que aguardam Tess. Ao adentrar os compartimentos secretos da casa, ela se depara com um corredor sombrio que esconde um mistério ainda maior. A tensão cresce de forma magistral, enquanto o filme conduz o espectador por uma jornada de sustos e incertezas.

Em um movimento narrativo inesperado, o filme muda de perspectiva, focando em AJ (Justin Long), o proprietário da casa. AJ é um artista acusado de assédio sexual que, ao retornar à sua propriedade, encontra os pertences de Tess e Keith intocados por semanas. Embora estranhe a situação, ele inicialmente opta por ignorá-la. Entretanto, a curiosidade o leva até o porão, onde ele descobre os segredos perturbadores que a casa esconde.

O verdadeiro terror do filme se revela na forma de uma mulher deformada, uma figura trágica e perturbada, que habita os cantos escuros da casa. Ela está desesperada para ter um filho a quem possa cuidar, uma obsessão que a transforma em uma ameaça mortal para qualquer um que cruze seu caminho.

Conforme a história da criatura é desvendada, o filme lança luz sobre a violência e a degradação que a transformaram nesse monstro, refletindo de forma perturbadora sobre a monstruosidade latente em muitos aspectos da sociedade.

“Noites Brutais”, disponível na Netflix, pode não ter executado sua proposta da forma mais refinada, mas o roteiro de Zach Cregger é, sem dúvida, um exercício de criatividade e potencial. O filme cria uma atmosfera de tensão que raramente dá trégua, e seu subtexto, que explora a violência contra as mulheres, eleva a obra para além de um simples terror. Mais do que um entretenimento de horror, é um lembrete de que o mundo, frequentemente, é um lugar hostil e perigoso, especialmente para aquelas que devem constantemente navegar por sinais de perigo invisíveis.


Filme: Noites Brutais
Direção: Zach Cregger
Ano: 2022
Gênero: Terror/Mistério/Suspense
Nota: 8/10

Fer Kalaoun

Fer Kalaoun é editora na Revista Bula e repórter especializada em jornalismo cultural, audiovisual e político desde 2014. Estudante de História no Instituto Federal de Goiás (IFG), traz uma perspectiva crítica e contextualizada aos seus textos. Já passou por grandes veículos de comunicação de Goiás, incluindo Rádio CBN, Jornal O Popular, Jornal Opção e Rádio Sagres, onde apresentou o quadro Cinemateca Sagres.