As violações de direitos humanos assumem uma forma colossal e devastadora na figura do icônico Godzilla em “Godzilla Minus One”, uma homenagem digna às sete décadas de um dos monstros mais emblemáticos do cinema. A franquia, que teve início em 1954 sob a direção de Ishirō Honda (1911-1993), mantém sua força e relevância, trazendo novamente à vida uma criatura gigantesca, implacável e de aparência repulsiva, que emerge do oceano Pacífico para espalhar terror entre um grupo de soldados nos momentos finais da Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
A narrativa construída por Takashi Yamazaki, embora inicialmente sutil, vai ganhando intensidade à medida que o lendário monstro avança inexoravelmente pelo Japão, deixando um rastro de destruição e confusão entre as autoridades. Apenas um herói inesperado decide confrontar a força destrutiva do réptil gigante. Yamazaki e o co-roteirista Takeo Murata exploram, com habilidade, elementos já familiares aos fãs da franquia, criando um prelúdio emocionante para “Godzilla e Kong: O Novo Império” (2024), de Adam Wingard. O novo filme promete colocar Godzilla ao lado de um parceiro igualmente assustador, em uma missão que se insinua quase redentora.
No centro dessa devastação está o alferes Koichi Shikishima, um ex-piloto kamikaze que, milagrosamente, sobreviveu à guerra. No entanto, sua segunda chance de se tornar o herói que sua nação anseia é novamente perdida quando ele falha em deter Godzilla. Um ano depois, em 1946, com o país em ruínas, Shikishima é confrontado por uma mulher que o acusa diretamente de covardia, uma denúncia que ressoa tanto na tela quanto no público. Esse confronto revela a complexidade moral do personagem, um homem dividido entre seus ideais patrióticos e o instinto de autopreservação, incapaz de cumprir as expectativas que a nação coloca sobre ele.
É neste ponto que Yamazaki começa a explorar com mais clareza temas como ultranacionalismo e xenofobia, revelando camadas sombrias da personalidade de Shikishima. Ryunosuke Kamiki interpreta com maestria um homem assombrado pela culpa, buscando a redenção ao tentar salvar os sobreviventes de um Japão devastado. A complexidade emocional do personagem reflete os dilemas de um país em busca de reconstrução, ainda lidando com as feridas deixadas pela guerra e pela ocupação.
Os dilemas internos de Shikishima são intensificados pelas interações com figuras como Kenji Noda, um engenheiro de armas dedicado, vivido por Hidetaka Yoshioka, e Sosaku Tachibana, um ex-mecânico da Marinha interpretado por Munetaka Aoki. Embora seja uma trama predominantemente masculina, a presença de Noriko Oishi, encarnada por Minami Hamabe, e sua filha adotiva Akiko, vivida por Sae Nagatani, oferece um contraponto delicado, trazendo sensibilidade à narrativa através de suas interações com os personagens masculinos. E quanto ao próprio Godzilla, a criatura titânica e aterrorizante, embora central, atua como uma força secundária, servindo mais como um símbolo do caos que como protagonista.
Este novo capítulo da saga de Godzilla, além de oferecer cenas de ação grandiosas e devastadoras, aprofunda questões humanas e morais de maneira inovadora, mantendo-se fiel ao espírito da franquia.
Filme: Godzilla Minus One
Direção: Takashi Yamazaki
Ano: 2023
Gêneros: Ação/Ficção científica
Nota: 8/10