Vencedor do Oscar, uma das mais belas histórias de amor do cinema no século 21 está na Netflix Divulgação / Miramax Films

Vencedor do Oscar, uma das mais belas histórias de amor do cinema no século 21 está na Netflix

A brutalidade insensata de uma nação que se devora em batalhas fratricidas, motivadas por um conflito cuja resolução deveria ser evidente, encontra sua redenção no poder transformador do amor. Essa é a mensagem central que Anthony Minghella (1954-2008) transmite, com uma mistura de leveza e convicção, em “Cold Mountain”. O filme é mais um dos épicos históricos que abordam a Guerra Civil Americana (1861-1865), retratando o caos emocional que envolve homens e mulheres em meio a confrontos que tornam a guerra comparável a um inferno de proporções colossais.

O diretor, que já havia demonstrado familiaridade com esse tipo de narrativa, utiliza seu conhecimento para dar vida a um turbilhão de sentimentos em meio ao conflito. A Guerra de Secessão, que dividiu o Sul escravocrata do Norte abolicionista e consolidou a segregação racial que persistiu por décadas, serve como pano de fundo para a conturbada relação entre Ada Monroe, uma jovem refinada e bela filha de um reverendo de Charleston, e Inman Balis, um soldado confederado hesitante e abatido pelos horrores da guerra.

A adaptação que Minghella faz do romance de Charles Frazier, publicado em 1997, capta com precisão a essência quase etérea desse encontro, embora essa mesma abordagem possa tornar a história um tanto artificial, até mesmo para os padrões dos best-sellers contemporâneos. A guerra, frequentemente palco para o surgimento de heróis e mártires, não parece, neste caso, oferecer tal espaço para Inman. Ele não é movido por grandes ambições ou um desejo de glória; ao contrário, seu desencanto com a brutalidade dos conflitos e as atrocidades que presencia o consome rapidamente.

O horror das armas, os bombardeios incessantes, e as trincheiras devastadas do Sul ocupam sua mente e corroem sua alma. Desiludido, ele reflete sobre o massacre de jovens, recém-saídos da adolescência, mortos em combate de maneira fria e impiedosa, lembrando o clássico “Nada de Novo no Front”(1928), de Erich Maria Remarque, uma obra que explora os horrores da guerra através dos olhos de um soldado igualmente desiludido.

Minghella opta por explorar a natureza quase mística do amor entre Ada e Inman, e aqui reside o charme do filme. A atuação de Jude Law, que interpreta Inman, carrega nuances sutis de humanidade em meio à paisagem gélida, dominada pela neve azulada que a fotografia de John Seale capta com tanta precisão. Inman, apesar de sua covardia em alguns momentos, demonstra uma sensibilidade que o torna um personagem complexamente cativante.

Seus diálogos repletos de melancolia e angústia trazem à tona a desilusão de um homem que perdeu a fé em qualquer tipo de heroísmo bélico. Enquanto isso, Nicole Kidman, no papel de Ada, assume mais espaço entre o segundo e o terceiro ato do filme. Sua personagem, envolta em cenas carregadas de dramaticidade, acaba revelando suas próprias fragilidades como atriz, com um monólogo final que, ao tentar evocar profundidade, acaba recaindo em uma coleção de frases sentimentais e previsíveis, comprometendo parte do impacto que a narrativa poderia ter alcançado.

Ainda que “Cold Mountain” traga semelhanças inevitáveis com “O Paciente Inglês” (1996), outra obra de Minghella que também mescla romance e guerra, a história de Inman e Ada consegue encontrar seu próprio ritmo. O desenrolar do enredo, contudo, não é isento de falhas. Se por um lado a jornada emocional dos personagens é cativante, por outro, o filme falha em entregar um desfecho realmente memorável. Ao final, o espectador é deixado com a sensação de que, assim como nem todos os poços permitem vislumbrar o sol ao fundo, nem toda história de amor ambientada no campo de batalha encontra a sua redenção completa.


Filme: Cold Mountain
Direção: Anthony Minghella
Ano: 2003
Gêneros: Guerra/Drama/Romance
Nota: 8/10