O filme que Quentin Tarantino e Guy Ritchie consideram a melhor produção da história da Netflix John Wilson / Netflix

O filme que Quentin Tarantino e Guy Ritchie consideram a melhor produção da história da Netflix

O paradoxo que envolve a solidão humana, desde o início da vida até o seu fim, revela-se em situações onde, frequentemente, não encontramos em outros o desejo de compartilhar vivências ou emoções que justifiquem nossa existência. Guardamos segredos em refúgios mentais, longe da curiosidade alheia, na tentativa de evitar surpresas desagradáveis. Mesmo assim, persistimos, quase obsessivamente, em ajustar-nos ao que esperam de nós, seguindo padrões comportamentais implícitos. Esses padrões, por vezes, servem como um meio para esquecer nossas angústias, traumas e manias, que acabam por tornar a rotina um pouco menos enfadonha. No entanto, há sempre uma expectativa silenciosa de encontrar alguém cujas peculiaridades possam refletir as nossas, sem segundas intenções ou artifícios.

Com o passar dos anos, à medida que amadurecemos, percebemos que as amizades forjadas na infância tendem a ser mais duradouras, embora, paradoxalmente, a própria vida se encarregue de desmanchar esses laços quando adultos. Isso reafirma o poder transformador da amizade, que, quando bem nutrida, pode alterar não apenas uma, mas várias histórias. Mesmo sentimentos aparentemente inconciliáveis, como água e óleo, podem criar algo novo e indefinível, mantendo vivos os afetos que nunca se apagam. Esse não é o caso dos personagens do filme em questão. Na continuação de uma trama ainda repleta de possibilidades, o diretor mantém o suspense bem alinhado, expondo os dramas de personagens ricos e entediados, que se envolvem em jogos perigosos para escapar de suas vidas irrelevantes.

Inspirado por uma música dos Beatles, o roteiro revela as múltiplas camadas das relações humanas, demonstrando sua capacidade de filtrar e distorcer qualquer luz que as atravesse. Johnson presta uma homenagem singular à Agatha Christie, sem perder o humor que equilibra a narrativa, algo que a própria Dama do Crime provavelmente apreciaria. Assim como no primeiro filme da franquia, o diretor subverte as regras do gênero, não priorizando quem cometerá o crime, mas sim em que momento a trama revelará o assassino. No filme anterior, a vítima era Harlan Thrombey, um escritor de suspenses, morto de forma brutal aos 85 anos. Já agora, Benoït Blanc, o detetive sofisticado interpretado por Daniel Craig, se envolve nas excentricidades de convidados desequilibrados.

A crítica social mordaz de Johnson permanece afiada, destacando as extravagâncias de Kate Hudson, que interpreta uma socialite desmiolada, e Janelle Monáe, que assume o papel de consciência moral do grupo. No entanto, o principal defeito do filme talvez seja sua longa duração, o que leva o público a especular excessivamente sobre o desfecho. Mas, quem sabe, a próxima aparição de Benoït Blanc corrija esse detalhe.


Filme: Glass Onion: Um Mistério Knives Out
Direção: Rian Johnson
Ano: 2022
Gêneros: Thriller/Crime/Comédia
Nota: 9/10