Filosofia de Immanuel Kant ganha vida em novo filme com Joaquin Phoenix e Emma Stone na Netflix

Filosofia de Immanuel Kant ganha vida em novo filme com Joaquin Phoenix e Emma Stone na Netflix

Abe Lucas encontra-se à beira de um precipício emocional em “Homem Irracional”, e Woody Allen, o cineasta por trás da obra, é um mestre em explorar as intricadas armadilhas da mente humana. Allen já havia demonstrado seu talento em mergulhar nas profundezas da psique de seus personagens em trabalhos anteriores como “Celebridades” (1998), “O Escorpião de Jade” (2001) e “Scoop — O Grande Furo” (2006), uma adaptação de um romance britânico de Evelyn Waugh. Entre esses filmes, “Scoop” se destaca pela habilidade de Allen em criar figuras complexas, cujo desejo por sucesso é constantemente ameaçado por emoções contraditórias, especialmente o impulso de alcançar algo mais elevado, porém arriscado.

“Homem Irracional” talvez seja a obra em que Allen se mostre mais destemido ao desafiar convenções. Este filme faz uma crítica sutil, porém incisiva, sobre justiça e moralidade, temas que, de certo modo, ecoam os escândalos de sua própria vida, frequentemente expostos pela mídia. Assim, o diretor canaliza essas experiências para construir o protagonista, um homem comum, dotado de brilhantismo, mas profundamente perturbado.

O cenário encantador da Nova Inglaterra, capturado com perfeição pela fotografia de Darius Khondji, compõe o ambiente onde Abe Lucas, vivido por Joaquin Phoenix, busca refúgio. A chegada de Abe à fictícia Newport, Rhode Island, ocorre em uma tarde de outono, onde o céu alaranjado e as folhas de um verde desbotado criam uma paisagem que parece refletir o próprio estado emocional do protagonista. Nesse contexto, o extenso monólogo filosófico de Abe, que introduz o filme, ganha um tom quase lúdico quando acompanhado pela trilha sonora suave do Ramsey Lewis Trio.

Phoenix, com uma sutileza que beira o desconforto, transmite a inadequação de Abe através de pequenos gestos — um toque no cabelo, um olhar evasivo — como se cada movimento fosse uma tentativa de fugir de si mesmo e do público que inevitavelmente o observa. Ao chegar ao campus da universidade onde passará a lecionar, Abe é recebido com uma certa reverência, quase como uma figura pop, saudado pela reitora e seus futuros colegas. No entanto, por trás dos sorrisos e da atenção, sua apatia persiste, apenas brevemente interrompida ao perceber que os presentes estavam impressionados com um de seus ensaios, algo que momentaneamente lhe devolve um senso de propósito.

O papel de Emma Stone, como Jill Pollard, introduz uma nova camada ao filme, trazendo à tona o lado mais impulsivo e caótico de Abe. Jill, uma estudante brilhante, mas inconformada, serve como catalisador para que Abe abandone qualquer noção de autocontrole que lhe restava. O roteiro de Allen, ao insinuar um crime cometido pelo anti-herói, abre as portas para um debate moral: Abe é uma vítima das circunstâncias ou um vilão inescapável de suas próprias escolhas? Allen, contudo, deixa claro para o público onde reside sua própria inclinação, propondo uma visão que inevitavelmente desagrada certos pensadores, especialmente aqueles que enxergam a vida de forma rígida e linear.

Assim, “Homem Irracional” não é apenas mais uma incursão no universo do cineasta, mas uma reflexão mais ampla sobre os dilemas éticos que permeiam a sociedade moderna, envoltos em uma narrativa instigante e visualmente deslumbrante.


Filme: Homem Irracional
Direção: Woody Allen
Ano: 2015
Gêneros: Mistério/Crime
Nota: 9/10