Adaptação de livro ganhador do Pulitzer, com Kiefer Sutherland, na Netflix Divulgação / Showtime Networks

Adaptação de livro ganhador do Pulitzer, com Kiefer Sutherland, na Netflix

Uma nova versão do clássico de 1954, “A Nave da Revolta”, originalmente estrelado por Humphrey Bogart, revisita o icônico enredo com uma abordagem contemporânea. Inspirado no romance “The Caine Mutiny Court-Martial” de Herman Wouk, publicado em 1951, o filme acompanha o julgamento do tenente Stephen Maryk (Jake Lacy), acusado de motim após ter assumido o comando de um destroyer da marinha americana. Embora o romance original se passe no cenário da Segunda Guerra Mundial, essa nova adaptação transpõe os eventos para o ano de 2022, em pleno Estreito de Ormuz, mantendo o clima de tensão e decisões extremas.

Essa história já foi adaptada anteriormente, notavelmente em 1988, quando Robert Altman dirigiu uma versão para a televisão, com Jeff Daniels no papel de Maryk e Brad Davis interpretando o controverso capitão Queeg. As várias adaptações dessa trama receberam ampla aclamação crítica, mas a versão de 1954 continua sendo a mais destacada, com sete indicações ao Oscar e outras honrarias.

O centro da trama gira em torno da decisão de Maryk de tomar o controle do navio durante uma tempestade, alegando que o capitão Queeg (Kiefer Sutherland) teria perdido o controle emocional, colocando a tripulação em perigo iminente. O julgamento de Maryk é o ponto central do filme, onde ele argumenta que suas ações foram tomadas para preservar a segurança de todos a bordo. Ao longo do tribunal, uma batalha de argumentos se desenrola, levando a corte-marcial a ponderar se a atitude de Maryk foi justificada ou se de fato constituiu um motim.

O filme, com duração de uma hora e quarenta e oito minutos, é um exercício de contenção narrativa. A história se desenrola exclusivamente na sala de julgamento, criando um ambiente quase teatral, onde a atuação dos personagens é o foco absoluto. Sem o uso de efeitos especiais ou grandes cenas de ação, o ritmo do filme se sustenta nos diálogos densos e nas performances intensas. A direção de William Friedkin, em sua última obra, potencializa esse ambiente austero e introspectivo. Friedkin, célebre por filmes como “O Exorcista”, “Operação França” e “Viver e Morrer em Los Angeles”, orquestra esse drama de tribunal com precisão cirúrgica. Também marca a despedida de Lance Reddick, no papel do capitão Luther Blakley, que conduz a acusação contra Maryk.

Jason Clarke, no papel do advogado de defesa, tenente Barney Greenwald, desempenha um papel crucial ao transformar a linha de defesa, focando na condição mental do capitão Queeg. O objetivo é provar que Queeg sofre de uma série de transtornos psicológicos, incluindo paranoia e estresse pós-traumático, que comprometem sua habilidade de liderar de forma eficaz. Ao longo do julgamento, várias testemunhas entram e saem de cena, cada uma contribuindo com novas camadas de complexidade à trama. Friedkin utiliza enquadramentos de forma estratégica para manipular a percepção dos espectadores sobre quem realmente é o vilão ou herói nessa história.

O filme pode desafiar a paciência de espectadores que preferem uma narrativa mais ágil, pois o ritmo é deliberadamente lento e calculado, como um jogo de xadrez. A trama explora temas profundos e relevantes, como a tensão entre submissão e insubordinação, e a fragilidade da sanidade humana sob pressão extrema. O drama judicial mergulha na psiquê de seus personagens e questiona os limites da moralidade, especialmente em contextos militares, onde a obediência à autoridade é absoluta. Porém, o filme também provoca reflexões sobre quando é justificável desobedecer uma ordem, sobretudo quando a liderança se mostra incapaz de distinguir o certo do errado.

Ao longo de cada sequência, “A Nave da Revolta” provoca no público uma análise das complexidades do comportamento humano e dos dilemas éticos enfrentados por aqueles que operam em ambientes de alta pressão. O retrato das lutas internas e externas desses personagens faz com que o filme transcenda o cenário militar, explorando a essência do que significa assumir responsabilidades em momentos de crise. Para quem aprecia tramas que exploram as nuances da justiça, moralidade e liderança, o filme se destaca como uma experiência cinematográfica rica e reflexiva.


Filme: The Caine Mutiny Court-Martial
Direção: William Friedkin
Ano: 2023
Gênero: Drama
Nota: 9