Uma história fascinante sobre amor, a busca pela felicidade, a solidão e o amadurecimento, na Netflix Divulgação / Braven Films

Uma história fascinante sobre amor, a busca pela felicidade, a solidão e o amadurecimento, na Netflix

Nos últimos anos, Sebastián Lelio tem se consolidado como um cineasta cuja marca é a representação de mulheres que não se conformam às normas sociais. Seus trabalhos abordam as lutas femininas contra um sistema de exclusão que oprime, retratando histórias de resistência em busca da autoafirmação. Em “Desobediência”, Lelio ambienta a trama dentro do judaísmo ortodoxo, utilizando essa doutrina como metáfora para qualquer crença que dita o destino alheio, sem oferecer espaço para escolha ou mudança.

Em produções anteriores, Lelio também explorou vidas femininas presas em ciclos de conformidade. Em “Gloria”, a personagem central, uma mulher divorciada, é forçada a romper com sua rotina monótona após um envolvimento que a faz revisitar aspectos dolorosos de seu passado. Já em “Uma Mulher Fantástica”, ele mostra o luto de uma mulher transgênero que, além de perder o companheiro, precisa enfrentar uma sociedade hostil. Seguindo essa linha de narrativas desafiadoras, “O Milagre” reafirma seu talento para histórias que exploram as profundezas da experiência humana.

O filme baseado no livro de Emma Donoghue, lançado em 2022, tem semelhanças claras com “Desobediência”, ao explorar os limites da fé em relação à liberdade individual. Assim como Ronit Krushka, a personagem central, a protagonista de “O Milagre”, Lib Wright, se vê envolvida em um enredo que confronta as barreiras impostas por uma crença rígida. Ao investigar o mistério em torno de Anna O’Donnell, uma jovem que supostamente vive sem se alimentar há meses, Lib se depara com uma realidade distorcida pela fé, onde o escândalo religioso permeia cada aspecto da vida.

O filme também explora a questão do livre-arbítrio, central para a filosofia de Lelio, e o faz através de uma analogia com a criação divina. Em um sermão realizado antes de sua morte súbita, Rav Krushka, pai de Ronit, reforça a ideia de que o ser humano é o único ser com a capacidade de escolha, o que o torna tanto elevado quanto corruptível. Essa tensão entre o instinto natural, a moralidade divina e as escolhas humanas está no cerne dos dilemas enfrentados por Ronit ao retornar ao seu antigo lar e reencontrar Esti, sua antiga paixão, agora casada com Dovid, o filho adotivo de Rav.

A chegada de Ronit desencadeia uma série de eventos que expõem a hipocrisia e os segredos da comunidade, colocando em dúvida a moralidade de todos os envolvidos. O relacionamento entre Ronit e Esti, que outrora fora uma razão para o rompimento com seu pai, volta à tona, revelando sentimentos reprimidos que transformam a dinâmica entre os três protagonistas. Rachel Weisz, Rachel McAdams e Alessandro Nivola dominam a narrativa, conduzindo o público por um turbilhão de emoções contraditórias e complexas.

Ao longo do filme, Lelio mantém o público cativo com uma trama de manipulação emocional que culmina em um clímax ambíguo. Nenhum dos personagens escapa de ser visto como o vilão da história: Ronit, por desestabilizar a vida do casal; Esti, por sua indecisão; e Dovid, por sua passividade em relação ao que acontece ao seu redor. A tensão aumenta ainda mais com a revelação da gravidez de Esti, colocando em xeque todas as escolhas feitas até aquele momento.


Filme: Desobediência 
Direção: Sebastián Lelio 
Ano: 2017 
Gêneros: Romance/Thriller 
Nota: 9/10