Indicado a 88 prêmios, o ganhador do Oscar que está na Netflix David Appleby / Paramount Pictures

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A cena de abertura de “Rocketman” tem o impacto de uma epifania, claramente o que Dexter Fletcher almejava. O diretor constrói um musical inspirado na vida de Elton John, especialmente sua fase como Reginald Kenneth Dwight, um garoto de Pinner, subúrbio londrino. O foco está menos em uma narrativa fiel e mais na criatividade estilística. Logo no início, Taron Egerton, interpretando Elton, aparece em um traje extravagante, cruzando um corredor e desabafando sobre sua vida para um grupo de estranhos, em uma sequência iluminada e surreal.

Desde o início, Fletcher estabelece que “Rocketman” é muito mais uma celebração musical do que um relato biográfico. A visão do diretor não se prende à realidade, com elementos ficcionais e caricaturas de momentos da vida de Elton. Ele mescla fantasia com trechos de eventos reais, distorcendo alguns para amplificar a dramaticidade.

O roteiro, assinado por Lee Hall, explora a lacuna afetiva entre Elton e seus pais. Stanley, seu pai, era emocionalmente distante, e Sheila, sua mãe, envolvida em uma relação de conveniência, é retratada com frieza. O filme sugere que esses laços familiares moldaram tanto os talentos musicais de Elton quanto seus vícios e excessos, como uma resposta às carências afetivas.

Elton, com um talento nato ao piano desde cedo, alcançou sucesso, mas a ausência de afeto e o desprezo dos que o cercavam deixaram marcas profundas. Isso é enfatizado quando o roteiro retrata suas lutas internas, vícios e excessos, em contraste com sua busca incessante por aceitação e reconhecimento, não só como artista, mas também como indivíduo. Essa busca incessante é refletida na sua relação com John Reid, empresário e amante, e sua difícil convivência com a própria fama.

Egerton, ao longo da trama, constrói uma performance sólida, transitando entre drama e musical com fluidez. A sequência em que Elton compõe “Your Song” é emblemática, mostrando não só o talento do músico, mas também sua relação com Bernie Taupin, interpretado por Jamie Bell, seu fiel parceiro na criação musical. Essa relação, platônica mas profunda, é uma das âncoras emocionais do filme, e a música torna-se um elo de expressão para emoções que Elton, na vida real, tinha dificuldade em verbalizar.

“Rocketman” é frequentemente comparado a “Bohemian Rhapsody”, mas enquanto o filme sobre Freddie Mercury busca um realismo mais próximo da realidade, “Rocketman” se aventura no terreno da fantasia, assumindo-se como uma biografia criativa, onde a música, mais do que os fatos, é o veículo principal. Fletcher faz questão de destacar a arte de Elton, especialmente com performances musicais que ganham vida própria e funcionam como catalisadores da narrativa.

A conclusão do filme traz Elton John em sua fase de redenção, após as turbulências com drogas e excessos. A canção “I’m Still Standing”, de 1983, marca o renascimento pessoal e profissional do artista, simbolizando sua resiliência. Embora o filme traga o lado glamoroso e turbulento da vida de Elton, em seu cerne, revela um homem em busca de algo simples: uma vida tranquila, com uma família para cuidar.


Filme: Rocketman
Direção: Dexter Fletcher
Ano: 2019
Gêneros: Drama/Biografia/Musical
Nota: 8/10