Baseado em filosofia de Jean-Paul Sartre e Jeremy Bentham, obra-prima do cinema europeu que venceu o Oscar está na Netflix Divulgação / Samuel Goldwyn Film

Baseado em filosofia de Jean-Paul Sartre e Jeremy Bentham, obra-prima do cinema europeu que venceu o Oscar está na Netflix

Dirigido por Thomas Vinterberg e coescrito com Tobias Lindholm, “Druk — Mais Uma Rodada” foi agraciado com o Oscar de Melhor Filme Internacional em 2021, marcando o quarto triunfo da Dinamarca nessa categoria. O título original, “Druk”, uma palavra exclusiva do dinamarquês, não tem tradução direta, mas remete à ideia de “embriagar-se”. Já o título em inglês, “Another Round”, traz um jogo de palavras que sugere tanto “mais uma rodada de bebida” quanto a oportunidade de uma nova fase na vida, um recomeço.

Em conversas com o cineasta Guillermo del Toro, disponíveis no YouTube, e em entrevistas concedidas durante o Festival de Cinema de Toronto, Vinterberg destacou que o consumo de álcool na Dinamarca é extremamente comum e socialmente aceito, diferindo de muitos outros países. Essa normalização cultural do consumo excessivo de bebidas alcoólicas é um ponto central do filme.

A narrativa de “Druk” se apoia em uma teoria peculiar que circula na Dinamarca: a ideia de que todas as pessoas deveriam ter uma pequena concentração de álcool no sangue desde o nascimento, pois isso as tornaria mais afáveis, criativas, corajosas e autênticas. No entanto, o álcool também carrega o potencial de arruinar vidas, uma dualidade que o filme explora com sensibilidade.

O enredo gira em torno de quatro professores de ensino médio, homens de meia-idade que enfrentam crises pessoais e profissionais, desiludidos com a monotonia de suas vidas e o distanciamento de sua juventude vibrante. Em busca de renovação, eles decidem seguir um experimento: manter um nível constante de álcool no sangue durante o expediente, baseando-se em um estudo que sugere que isso os tornaria mais interessantes e eficazes. Inicialmente, a experiência traz resultados positivos, mas a situação inevitavelmente foge ao controle.

Apesar da trama delicada, Vinterberg não queria que o filme soasse moralista. Ele almejava uma reflexão sobre a aceitação das imperfeições humanas e a importância do auto perdão. O contexto de criação do filme também é marcado por uma tragédia pessoal: a morte de sua filha, apenas quatro dias antes do início das filmagens, em um acidente de carro. Ela tinha 19 anos e atuaria no filme. A carta que ela escreveu ao pai, expressando entusiasmo pelo roteiro, serviu de impulso para Vinterberg seguir com o projeto, transformando a produção em uma espécie de homenagem silenciosa.

“Druk” conta com a interpretação magnética de Mads Mikkelsen, um dos mais renomados atores da Dinamarca, comparável ao impacto de Ricardo Darín na Argentina. Mikkelsen, que já brilhou em produções como “A Caça”, “Valhalla Rising”, “Pusher” e a série “Hannibal”, entrega uma atuação envolvente. Uma cena em particular, onde Mikkelsen exibe uma dança performática, é memorável. A preparação rigorosa para essa sequência reforça a dedicação do ator ao papel, proporcionando um dos momentos mais icônicos do filme.

Com uma abordagem cuidadosa sobre o alcoolismo, “Druk” evita julgamentos severos ou didatismos. Em vez disso, sugere uma reflexão sobre a vida, o prazer e o equilíbrio, incentivando uma vivência autêntica e consciente. O filme convida o público a contemplar as complexidades da condição humana, oferecendo uma experiência cinematográfica profunda e emocionalmente ressonante.


Filme: Druk – Mais Uma Rodada
Direção: Thomas Vinterberg
Ano: 2020
Gênero: Drama
Nota: 10

Fer Kalaoun

Fer Kalaoun é editora na Revista Bula e repórter especializada em jornalismo cultural, audiovisual e político desde 2014. Estudante de História no Instituto Federal de Goiás (IFG), traz uma perspectiva crítica e contextualizada aos seus textos. Já passou por grandes veículos de comunicação de Goiás, incluindo Rádio CBN, Jornal O Popular, Jornal Opção e Rádio Sagres, onde apresentou o quadro Cinemateca Sagres.