O apocalipse, como todos sabemos, incita a curiosidade de qualquer um que perceba correr em suas veias ao menos uma gota de sangue que não tenha sido maculado pela indiferença com as causas que preocupam — ou deveriam preocupar — todo o mundo. Um grande perigo desse jaez materializou-se quando da eclosão da pandemia de covid-19, mal com que teremos de conviver para o resto da eternidade, seja lembrando quem tombou pelo vírus, seja receando sua volta sob as tantas e imprevisíveis mutações, deixando claro que não é exatamente paranoia temer inimigos ocultos. Roland Emmerich é uma grife no que respeita a produções sobre monstros e hecatombes que ameaçam nossa vidinha singular. Diretor de arrasa-quarteirões a exemplo de “Independence Day” (1996), “Godzilla” (1998), “O Dia Depois de Amanhã” (2004) e “Independence Day: O Ressurgimento” (2016), em “O Ataque” o alemão galvaniza a neurose e o perfeccionismo que o fizeram multimilionário — embora se perceba um certo descompasso temporal.
A despeito de se ser ou não religioso, tudo fica mais fácil quando, por alguma razão misteriosa, acredita-se num propósito superior, muito além da vã compreensão humana e de seu imediatismo animalesco. Chegar a esse ponto é que é o busílis, e mesmo quando se chega, a prova de fogo é passar por uma situação de desgaste extremo e sair do outro lado, ferido, sangrando, coxo, mas vitorioso — e só se tem certeza de que se é capaz de suportar a tempestade no momento em que a bonança já se anuncia. Por mais controverso que possa soar, distopias prestam-se a um notável refrigério para espíritos menos conformados com o caos que reina no mundo desde o princípio dos tempos. Se até agora não chegamos ao fundo do poço moral e econômico que nos aguarda e nos atrai, como a serpente que enfeitiça o camundongo e o devora sem ao menos ter de dar o bote, é só porque alguma força superior se compadece de nós, se penaliza dos infelizes já alijados do mínimo de que se necessita para uma existência suportável e permite que sigamos cada qual na sua agonia até que nos colha a morte, única solução para tantos daqueles há muito tomados pela consternação e pelo desespero.
O roteiro de James Vanderbilt põe abaixo a democracia americana mediante um engenhoso atentado à sede do Executivo americano, uma fortaleza ainda imune a qualquer ofensiva antidemocrática ao longo de seus 232 anos de história — a mesma sorte não teve o Capitólio, invadido em 6 de janeiro de 2021. Na introdução, uma garota dorme. O alerta de notícias toca às 6h37. O vice-presidente irá comandar a sessão do Senado que pode votar o plano de paz do presidente Sawyer para o Oriente Médio. No céu, uma esquadrilha de helicópteros arranca um sorriso dela. Essa garota é Emily, filha de John Cale, o anti-herói vivido com o carisma habitual por Channing Tatum, e junto com Tatum Joey King responde por muito da pouca graça do filme, que também não é um completo desastre por causa de Jamie Foxx. De resto, o de sempre.
Filme: O Ataque
Direção: Roland Emmerich
Ano: 2013
Gêneros: Ação/Thriller
Nota: 7/10