A comédia dramática mais assistida da história da Netflix: impossível imaginar que um filme pudesse te divertir tanto Boris Martin / Netflix

A comédia dramática mais assistida da história da Netflix: impossível imaginar que um filme pudesse te divertir tanto

A vida é um palco de angústias e aspirações, onde nos pressionamos a retribuir ao universo algo que ele jamais exigiu. É um universo indiferente às nossas necessidades mais íntimas, que não se importa com nossos medos sobre o futuro e que permanece imune ao turbilhão de nossas incertezas. Vivemos num constante vaivém de preocupações, alimentadas por obsessões que, muitas vezes, mal tocam a superfície do que realmente importa. A sensação de inadequação nos empurra para cenários desconfortáveis, perigosos até, que, inconscientemente, escolhemos. Com o tempo, essa sensação se dissipa, dando lugar a uma maturidade salvadora que, por fim, se torna nossa aliada nas crises inevitáveis. Esse amadurecimento, embora possa parecer quase mágico, é forjado na dureza das experiências vividas — um processo doloroso, mas essencial para afastar-nos da loucura que tantas vezes ameaça nos consumir.

O fim da juventude é uma conquista silenciosa. Superar os desafios impostos pela vida desde cedo requer sacrifícios que nem todos estão dispostos a fazer. Contudo, há momentos em que a existência se assemelha a uma brincadeira, repleta de surpresas trágicas e acontecimentos absurdos, que nos pegam desprevenidos e mudam tudo num instante. A narrativa de “De Volta ao Baile” (2022) é uma dessas histórias raras, que cativam precisamente por sua falta de sentido evidente. Alex Hardcastle captura o espírito caótico da vida com um humor que, embora cada vez mais escasso, é deliciosamente eficaz. Ele utiliza esse estilo para realçar a peculiaridade dos protagonistas, que desempenham seus papéis com um entendimento claro do absurdo que os circunda.

Arthur Knauer, Arthur Pielli e Brandon Scott Jones, roteiristas dessa comédia singular, conseguem transformar um enredo improvável em algo quase plausível, deixando o público a questionar o que realmente está vendo. Desde o início, fica evidente que o trio presta homenagem a uma juventude que, embora recente, já carrega uma aura de nostalgia. Os quarentões, em particular, se verão nas referências cuidadosamente escolhidas, enquanto Hardcastle abraça essas sugestões com entusiasmo, apoiado pela atuação impecável de Angourie Rice, que encarna a essência de uma adolescente dos anos 1990 com uma autenticidade impressionante. No entanto, quando sua personagem, Stephanie, cede lugar à versão adulta vivida por Rebel Wilson, a dinâmica da trama muda. Wilson, apesar de sua veia cômica, tende a exagerar em alguns momentos, equilibrando-se melhor ao contracenar com Sam Richardson, cujo personagem, Seth, traz um toque de nostalgia e realismo ao ainda nutrir sentimentos pela Stephanie do passado.

“De Volta ao Baile” funciona como uma alegoria dos desafios enfrentados por adolescentes dos anos 2000 ao ingressar na vida adulta em um mundo cada vez mais dominado por uma correção política opressiva. Embora o filme não ofereça grandes surpresas, ele compensa isso ao evocar memórias afetivas que ressoam com aqueles que viveram a época retratada, enquanto proporciona aos mais jovens uma visão nostálgica e encantadora do passado. A trilha sonora, repleta de sucessos de Avril Lavigne, Britney Spears, Shania Twain e Spice Girls, convida o público a cantarolar e reviver coreografias de um tempo que, embora distante, ainda pulsa com força nas lembranças. E assim, o filme nos deixa com uma agradável sensação de saudade, que persiste até a última nota.


Filme: De Volta ao Baile
Direção: Alex Hardcastle
Ano: 2022
Gênero: Comédia/Coming-of-age
Nota: 8/10