Na indústria do cinema, saber identificar um projeto com potencial não é uma ciência exata. “O Paciente Inglês” é um exemplo clássico de um filme que começou sua trajetória cercado por incertezas e dificuldades financeiras. Originalmente de propriedade da Fox, o projeto passou para as mãos da Miramax após um desentendimento entre o estúdio e o diretor Anthony Minghella. O impasse girava em torno da escolha de Kristin Scott Thomas para um dos papéis principais, com a Fox preferindo Demi Moore, que na época possuía mais notoriedade.
Além desse embate, o papel de Caravaggio, um personagem central na narrativa, foi oferecido a Bruce Willis, que o recusou seguindo a recomendação de seu agente. A decisão mostrou-se um grande erro, visto que “O Paciente Inglês” não apenas foi aclamado pela crítica, mas também arrecadou dez vezes o seu custo de produção nas bilheteiras e conquistou nove Oscars. A rejeição do papel levou Willis a demitir seu agente, algo compreensível considerando o sucesso monumental que o filme obteve.
Baseado no romance de Michael Ondaatje, um autor nascido no Sri Lanka e residente no Canadá, o livro foi publicado em 1992, com a adaptação cinematográfica lançada apenas quatro anos depois. Ondaatje, que também visitou o Brasil em 2005 para participar da Feira Internacional de Literatura de Parati, criou uma obra que se desdobra em um enredo épico. A narrativa do filme entrelaça histórias de forma complexa, mas eficaz, culminando em um final que amarra todas as pontas soltas de maneira impactante.
O longa-metragem inicia com a queda de um avião no deserto do Saara, carregando dois passageiros. Inicialmente, suas identidades são desconhecidas. Porém, à medida que o enredo se desenrola, descobre-se que o sobrevivente, Almásy (interpretado por Ralph Fiennes), era o piloto da aeronave.
A trama desenvolve-se em diferentes linhas temporais, sendo a principal focada na enfermeira Hana (Juliette Binoche), que cuida de soldados feridos durante a Segunda Guerra Mundial. Recentemente abalada pela morte de seu noivo no conflito, Hana se vê novamente tomada pela dor quando uma amiga enfermeira perde a vida, reforçando sua crença de que todos que ama estão destinados a morrer.
Hana assume a responsabilidade de cuidar de Almásy, um homem gravemente ferido por queimaduras que não consegue se lembrar de sua identidade ou passado. Os dois vagam pela Itália devastada pela guerra até encontrarem refúgio em um mosteiro abandonado, onde Hana transforma o local em uma enfermaria improvisada para cuidar de seu enigmático paciente. Aos poucos, descobrimos que Almásy não é o “paciente inglês” que todos presumem. Na realidade, ele é László Almásy, um piloto e cartógrafo húngaro que participou de expedições arqueológicas organizadas pela Royal Geographical Society.
A complexa trama revela que Almásy tinha sido envolvido em um romance secreto com Katherine Clifton, esposa de Geoffrey, outro membro da equipe de expedição. A relação clandestina, que começou durante o trabalho de documentação de pinturas rupestres no Cairo, desmorona por medo de serem descobertos. As lembranças de Almásy são trazidas de volta pelo livro que ele carrega consigo, uma cópia de “Histórias de Heródoto” cheia de notas e fotografias. Enquanto Hana cuida dele, ela enfrenta seus próprios dilemas emocionais, lutando contra a atração por Kip, um soldado do exército britânico indiano. Ao mesmo tempo, Caravaggio, um agente de inteligência canadense, surge em cena à procura de vingança contra o homem que o entregou aos nazistas, resultando em sua tortura.
As histórias interconectadas dos personagens se revelam de forma magistral, conduzindo a narrativa a um desfecho inesperado e profundamente comovente. “O Paciente Inglês” foi amplamente celebrado em seu lançamento, não apenas pelo enredo, mas também pela impressionante cinematografia de John Seale, que merecidamente conquistou o Oscar.
A estética visual do filme é marcada pelas vastas e desoladas paisagens desérticas, capturadas com maestria para intensificar a dramaticidade da história. As técnicas de iluminação, como o chiaroscuro, são empregadas para criar um ambiente de lirismo e emoção, fazendo com que cada cena ressoe profundamente com o público.
A riqueza dos detalhes, a profundidade dos personagens e as atuações impecáveis de um elenco talentoso solidificam “O Paciente Inglês” como um marco indelével na história do cinema. Disponível na Netflix, este épico continua a encantar e envolver novas gerações de espectadores, reafirmando sua relevância e beleza ao longo dos anos.
Filme: O Paciente Inglês
Direção: Anthony Minghella
Ano: 1996
Gênero: Romance/Drama
Nota: 10