O primeiro filme de Halle Berry a liderar o top 1 mundial da Netflix por duas semanas consecutivas Divulgação / Netflix

O primeiro filme de Halle Berry a liderar o top 1 mundial da Netflix por duas semanas consecutivas

A situação das mulheres nas sociedades contemporâneas talvez seja o reflexo mais contundente das profundas transformações ocorridas nas últimas cinco décadas. Se, até os anos 1970, encontrar uma mulher em posições de liderança era tão raro quanto avistar um extraterrestre, hoje em dia, é comum observar que, por trás de grandes corporações, desde o comércio varejista até os bancos públicos, há mulheres calçando sapatos de salto alto, usando batom e vestindo ternos de grife, enquanto exercem suas funções com uma inteligência afiada. As mudanças estruturais lideradas por mulheres ao redor do globo parecem quase um sonho distante quando comparadas à realidade histórica de onde elas partiram e o quão longe chegaram, graças a um esforço imenso e a sacrifícios pessoais consideráveis.

A protagonista de “A Liga” aparenta ter plena consciência de suas ações, mas, ao refletir sobre o que conquistou ao longo de sua carreira como agente secreta e tudo o que já perdeu (e continua a perder), percebe que lhe falta algo essencial. O diretor Julian Farino revela a alma atormentada de uma mulher que perdeu a fé nas boas intenções alheias, enquanto busca recuperar o tempo perdido ao lado de um antigo amor que não via há muito tempo. O roteiro de Joe Barton e David Guggenheim gira em torno dessa figura endurecida, que, fechada em si mesma, anseia por resgatar uma parte vital de sua essência, contando, naturalmente, com a ajuda de seu antigo parceiro.

Acima da essência de toda criatura paira a verdade inegável de que a vida é feita de sonhos, e estes, por sua vez, ignoram solenemente a lógica, o bom senso e qualquer outro conceito moral que se pretenda estabelecer. Enquanto somos escravizados pela ideia de ordem, previsibilidade e perfeição, as imagens e pensamentos mais absurdos e desconexos nos assombram implacavelmente. Quer admitamos ou não, eles ocupam um espaço permanente na mente de todos que se recusam a encerrar sua participação no processo civilizatório, pois o espírito humano, desde o início dos tempos, nunca se satisfaz completamente.

A fome pelo desconhecido que Roxanne Hall sente, paradoxalmente, revela o que realmente vale a pena na busca pela beleza da vida, um enigma que a maioria esmagadora das pessoas não resolve, e pior, desdenha solenemente, como se, ao não compreender as questões mais profundas da condição humana, estas deixassem de existir. Em seu conto de fadas pós-moderno, Farino une Roxanne, uma espiã glamorosa e independente, que alerta sobre uma tempestade no mar Adriático e o desaparecimento de um agente da CIA no quarto 620 do Grand Hotel Castelletto, em Trieste, na Itália, e Mike McKenna, um operário da construção civil falido de Patterson, Nova Jersey, que busca diversão, mesmo sem saber disso. Halle Berry e Mark Wahlberg demonstram uma química suficiente para evocar a dinâmica de Humphrey Bogart e Ingrid Bergman em “Casablanca” (1942), com os papéis trocados. Sem a mesma sutileza, mas com uma energia comparável.


Filme: A Liga
Direção: Julian Farino
Ano: 2024
Gêneros: Comédia/Ação/Policial
Nota: 8/10