Considerada a melhor atuação de Sarah Paulson, suspense arrepiante está na Netflix Allen Fraser / Netflix

Considerada a melhor atuação de Sarah Paulson, suspense arrepiante está na Netflix

A relação entre pais e filhos, mais do que um vínculo natural, é uma dança complexa de emoções e conflitos, marcada por conselhos nem sempre solicitados e divergências que podem parecer insuperáveis. Esses choques de gerações, com suas diferenças de perspectiva e entendimento do mundo, são um campo fértil para desentendimentos que, por vezes, assumem proporções trágicas, principalmente para aqueles que observam de fora, sem compreender a profundidade das intenções envolvidas. A lacuna entre o conhecimento de vida de um pai e as aspirações de um filho muitas vezes transforma situações cotidianas em potenciais pontos de ruptura.

A fase da adolescência exacerba essas tensões como nenhuma outra. É um período repleto de mudanças físicas e emocionais, onde os jovens enfrentam o caos dos hormônios, a presença súbita e desenfreada de pelos corporais, a pele marcada por espinhas, o ganho ou perda de peso descontrolado e um crescimento que pode ser tanto literal quanto figurativo. Simultaneamente, são bombardeados por um mundo externo igualmente instável, agitado, e por vezes opressor, que lança desafios constantes sobre mentes ainda em formação e espíritos desprotegidos.

Essa atmosfera de incerteza é o cenário perfeito para explorar a psicose e a paranoia, como é visto na personagem central de “Fuja”, uma mãe dominada por um medo irracional. Ao longo de pouco mais de noventa minutos, o diretor Aneesh Chaganty constrói um suspense psicológico envolvente, revelando segredos de maneira gradual e habilidosa. Junto com seu co-roteirista, Sev Ohanian, Chaganty cria uma narrativa que se desenrola de forma meticulosa, confiando nas atuações profundas de duas atrizes de estilos opostos que se complementam de forma magistral. A colaboração entre essas artistas adiciona camadas de profundidade a um enredo que poderia, em mãos menos hábeis, cair na banalidade.

Logo no início do filme, conhecemos Diane Sherman, uma mulher que acaba de dar à luz uma filha que já enfrenta uma série de desafios de saúde desde o nascimento, incluindo arritmia, asma e diabetes. A tensão palpável do momento é capturada pela cinematografia de Hillary Fyfe Spera, que usa uma paleta de cores verde para evocar a sensação fria e estéril dos quartos de hospital.

Avançando dezessete anos, vemos Diane dedicando sua vida a cuidar de Chloe, sua filha, sacrificando suas próprias ambições para garantir que a jovem tenha acesso a tratamentos de ponta e sessões intermináveis de fisioterapia. O ponto crucial do filme é que ele oferece espaço para que Sarah Paulson e Kiera Allen brilhem, com Paulson exibindo uma gama de emoções que vão do carinho genuíno à obsessão controladora, enquanto Allen, apesar de sua condição de esclerose múltipla na vida real, apresenta uma atuação vigorosa e perspicaz.

Chloe, apesar de suas limitações físicas, irradia uma determinação que desafia sua aparente vulnerabilidade. À medida que a história se desenvolve, a jovem começa a questionar a natureza de sua relação com a mãe, levantando suspeitas que até o espectador mais ingênuo é levado a considerar. O comportamento protetor de Diane se transforma em uma gaiola dourada, e as tentativas de Chloe de afirmar sua independência resultam em uma tensão crescente.

A desconfiança sutil que se insinua no coração da trama deixa claro que há segredos sombrios a serem desvendados, e a habilidade de Paulson em equilibrar ternura e manipulação aumenta a ambiguidade moral de sua personagem, mantendo o público constantemente em dúvida sobre suas verdadeiras intenções.

Chaganty manipula essa ambiguidade com destreza, brincando com as expectativas do público. A narrativa constrói uma desconfiança gradual em relação a Diane, sugerindo que sua devoção à filha esconde algo mais sinistro. O mistério se aprofunda com cada cena, mantendo os espectadores na beira de seus assentos, até que a revelação final, inesperada e chocante, ressignifica tudo o que se pensava saber até aquele ponto. O impacto desse desfecho não apenas confirma as suspeitas do público, mas também subverte as expectativas, oferecendo um clímax que é ao mesmo tempo perturbador e satisfatoriamente sombrio.


Filme: Fuja
Direção: Aneesh Chaganty
Ano: 2021
Gêneros: Terror/Mistério
Nota: 8/10