Ação de Antoine Fuqua com Denzel Washington, na Netflix Scott Garfield / Sony Pictures

Ação de Antoine Fuqua com Denzel Washington, na Netflix

A trajetória humana é marcada por uma vasta gama de comportamentos e valores, onde o idealismo e a pureza se destacam como qualidades raras em meio a uma maioria que, ou se acomoda na indiferença, ou abraça abertamente o lado sombrio da vida. Sem os poucos que se dedicam a combater as armadilhas deste mundo, viver com dignidade seria uma tarefa ainda mais árdua.

Em um cenário muitas vezes hostil, onde a maldade parece estar entranhada nas mais diversas relações — desde as familiares até as profissionais —, é inevitável questionar como lidar com a presença quase onipresente do mal. Afinal, como encontrar um equilíbrio quando a desonestidade e a corrupção, de tão difundidas, parecem ser o padrão em muitos ambientes? Isolar-se e viver em constante medo, como um molusco que se esconde em sua concha, ou mergulhar na escuridão do cinismo, aceitando a falsidade como parte inerente das interações humanas?

Antoine Fuqua explora esses dilemas em “O Protetor” (2014), conduzido pelo desempenho de seu protagonista, um herói que, apesar do cansaço evidente, continua a se empenhar em resolver conflitos que apenas pessoas como ele são capazes de enfrentar. O roteiro de Richard Wenk oferece uma análise detalhada desse personagem único, recheado de diálogos que, ao mesmo tempo, intrigam e iluminam, combinando elegância estética com profundidade reflexiva.

Contudo, é Denzel Washington quem eleva a narrativa a outro patamar, trazendo à vida um personagem que é tanto preciso quanto imprevisível, adicionando um brilho especial à história. Washington, com sua habilidade inigualável, transforma o roteiro em uma sequência de descobertas fascinantes, onde cada subtrama é habilmente conduzida para manter o público envolvido.

Fuqua não apenas se beneficia do roteiro de Wenk, mas também o utiliza para exceder as expectativas do público em relação à trama principal. No início do filme, precedido por uma citação de Mark Twain (1835-1910), o personagem de Washington, Robert McCall, apresenta-se como um homem de semblante sombrio, lembrando o motorista rancoroso Travis Bickle, imortalizado por Robert De Niro em “Taxi Driver” (1976), de Martin Scorsese.

No entanto, essa impressão inicial logo se desfaz: ao contrário de Bickle, McCall passa seu tempo livre refletindo sobre clássicos da literatura, como “O Velho e o Mar”, de Hemingway; “Dom Quixote”, de Cervantes; e “O Homem Invisível”, de H.G. Wells, o que o distingue completamente do anti-herói de De Niro. A interação de McCall com a jovem prostituta, interpretada por Chloë Grace Moretz, é um exemplo disso; ela se torna uma espécie de confidente casual, procurando-o para uma conversa tranquila antes de retomar sua rotina.

É essa relação com Teri, nome de guerra de Alina, que desperta em McCall um lado que ele acreditava ter deixado para trás. Ao descobrir que a garota foi brutalmente agredida — um incidente que se desenrola na Boston contemporânea, e não na Nova York dos anos 1970 de Scorsese —, McCall sente-se compelido a agir, incapaz de ignorar a injustiça.

O que se segue são algumas das cenas de luta mais bem coreografadas do cinema recente, nas quais Washington encarna um justiceiro que, munido de um simples saca-rolhas, enfrenta uma gangue de mafiosos russos com implacável determinação. Com um desfecho claramente satisfatório, “O Protetor” dispensa análises mais profundas. Em seus 132 minutos de duração, Denzel Washington reafirma seu status como um dos atores mais talentosos de Hollywood, ainda exibindo a vitalidade e o carisma de décadas atrás.


Filme: O Protetor
Direção: Antoine Fuqua
Ano: 2014
Gêneros: Ação/Thriller
Nota: 10