O filme policial da Netflix que foi assistido por 113 milhões de pessoas John Wilson / Netflix

O filme policial da Netflix que foi assistido por 113 milhões de pessoas

Os atores talentosos frequentemente se sentem impulsionados a ousar em suas escolhas, muitas vezes movidos por uma sensação de necessidade inata. Essa tendência de buscar novos desafios em vez de se acomodar em projetos previsíveis é, para muitos, uma demonstração da aptidão desses profissionais em navegar as complexidades de seu ofício. Quando confrontados com projetos convencionais, semelhantes a tantos outros, alguns atores optam por trilhar caminhos inesperados, motivados pelo desejo de inovação e pela vontade de revitalizar suas carreiras. Um exemplo dessa postura ousada foi a inesperada substituição de Idris Elba no papel do espião mais famoso do cinema. Embora o motivo para sua exclusão permaneça incerto, Elba não se abateu, como demonstra sua atuação em “Luther: O Cair da Noite”. No lugar de James Bond, surge John Luther, em um drama que foge do lugar-comum e rejeita o entretenimento fácil, ainda que seja fortemente enraizado na série televisiva que se tornou um fenômeno no Reino Unido por uma década.

A transição de “Luther” (2010-2019), série criada por Neil Cross e exibida pela BBC One, para um longa-metragem de mais de duas horas, coloca o protagonista em uma posição de um homem atormentado, um anti-herói cujas particularidades o afastam de comparações diretas com o icônico personagem de Ian Fleming. No filme dirigido por Jamie Payne, o detetive Luther atravessa um período sombrio em sua carreira, assumindo quase o papel de um espectro, uma figura que se move em tons muito abaixo do esperado para heróis tradicionais.

Sua investigação inicial, que define os rumos de sua vida e carreira, mergulha-o em uma espiral descendente, e a edição de Justine Wright, ao abrir o filme com um edifício vazio e iluminado na noite londrina, cria a atmosfera noir necessária para a narrativa de Cross. Idris Elba, com sua performance magistral, capta as nuances complexas de Luther, especialmente quando Payne começa a explorar o crime que o detetive precisa resolver — um desaparecimento envolto em suspeitas de suicídio. A primeira grande virada na história mostra Luther enfrentando um fracasso profissional devastador, que o leva a trocar seu surrado casaco cinza pelo uniforme de um prisioneiro.

As cenas de Luther na prisão, onde ele se mistura com os presos comuns — um cenário que exige a suspensão de descrença do público —, são intercaladas com as subtramas em que Cynthia Erivo brilha como Odette Raine, uma policial cujo passado pessoal também é repleto de turbulências emocionais, culminando na necessidade de resolver o caso mais doloroso de sua vida. Pequenos detalhes sensoriais, como o toque insistente de um telefone ou a exibição em tela cheia de um bizarro reality show, são recursos usados para manter o espectador imerso no ambiente caótico e esdrúxulo do filme, que inclui cenas de violência intensa, como um massacre em um palacete saudita, um incêndio de proporções assustadoras e um motim na prisão onde Luther está encarcerado.

O terceiro ato do filme oferece uma possível redenção para esse anti-herói exaurido, destacando a atuação de Andy Serkis como David Robey, o serial killer que espalha pânico em Londres e transforma a vida de John Luther em um caos absoluto. Embora assuma um caráter episódico, o filme de Jamie Payne consegue manter um fluxo consistente, equilibrando elementos televisivos com uma narrativa cinematográfica, resultando em uma experiência que, graças ao talento de Idris Elba, pode entreter até mesmo aqueles que não têm grande apreço por heróis de narrativas clássicas.


Filme: Luther: O Cair da Noite
Direção: Jamie Payne
Ano: 2023
Gêneros: Drama/Crime
Nota: 8/10