Enquanto Sol e sua mãe atravessam uma ponte, elas mergulham em um ritual silencioso, prendendo a respiração e fazendo um desejo. A menina, apenas sete anos, deseja com toda a força que seu pai viva. Ao lado dela, a mãe mantém os olhos fixos na estrada, carregando em si o peso de uma realidade inescapável. Essa simples, mas potente, cena encapsula “Tótem”, o segundo longa de Lila Avilés, que captura um dia inteiro da vida de Sol e sua família, onde o preparar de uma festa de aniversário se transforma em uma despedida silenciosa, uma celebração permeada por um luto que ainda não se revelou completamente.
Dentro da casa, a desordem familiar é quase palpável. Com Tona em repouso, suas irmãs e sobrinhas preenchem a casa com atividades frenéticas, movendo-se em um balé caótico que é ao mesmo tempo cômico e carregado de nostalgia. Conversas sobre bolos mal-assados e disputas por um espaço no banheiro se entrelaçam com murmúrios de preocupação e risos nervosos. Essa dança de emoções familiares é interrompida apenas pelo surgimento de uma tensão crescente, que insinua uma verdade mais profunda prestes a emergir da superfície.
O filme de Avilés apresenta uma textura visual que beira o artesanal, com a câmera em constante movimento, revelando a vida íntima dos personagens com uma autenticidade que transcende a mera observação. Diego Tenorio, com sua cinematografia hábil, captura emoções com precisão cirúrgica, enquanto os personagens se desdobram em camadas de profundidade emocional, sem nunca recorrer a diálogos expositivos. É nos silêncios e nas ações não ditas que o filme encontra sua maior força, deixando que os olhares e gestos falem mais alto do que qualquer palavra.
A jornada de Sol, marcada por suas interações com os animais ao seu redor, reflete sua crescente aceitação da realidade dura que a cerca. Os caracóis, inicialmente movidos para longe das plantas por um instinto de proteção, mais tarde são alinhados nas paredes da casa, simbolizando uma rendição silenciosa ao inevitável. Esses detalhes minuciosos, presentes no roteiro de Avilés, transformam o cotidiano em algo profundamente simbólico, onde cada pequena ação ganha uma nova dimensão.
Em “Tótem”, a autenticidade se manifesta em cada troca familiar, onde o banal carrega um peso emocional tremendo. A história é uma reflexão sobre o luto que se aproxima, abordado com uma delicadeza que raramente se vê, onde a alegria e a tristeza coexistem em uma dança íntima. Este filme não é apenas um retrato da vida; é uma imersão profunda na condição humana, uma exploração das muitas camadas de emoção que moldam nossas experiências mais difíceis, tudo apresentado de maneira tão tangível que o espectador sente cada momento como se fosse parte daquela família.
Filme: Tótem
Direção: Lila Avilés
Ano: 2023
Gêneros: Drama
Nota: 10