Dave e John Chernin pareciam dois colegiais durante a promoção de “Os Novatos” em Chelsea, bairro nobre e animado no lado oeste de Nova York. Pudera: seu mais recente trabalho, sobre um grupo de amigos que se aventura pelas insânias do ensino médio certos de que suas vidas nunca serão aquelas, é contagiante. Esse é um tempo de possibilidades até então jamais vislumbradas, e os irmãos tiram muito bom proveito de atores que parecem ter sido feitos para dar vida à história. Tornar-se quem se é quase sempre leva tempo, muito tempo. O texto dos Chernin defende que rapazes choram, sim, moças podem ser o que quiserem e o ensino médio se constitui uma fase ao longo da qual uns e outras são instados a superar os desafios tão próprios dessa época da vida, como se numa daquelas gincanas que todos achávamos divertidíssimas até dez anos atrás. Acontece que há, claro, as muitas circunstâncias em que viver mais parece um jogo, uma brincadeira de crianças travessas. Eventos inesperados, repentinos, trágicos, tudo quanto pode haver de surpreendentemente melancólico e acerbo no fado de uma pessoa se anuncia com toda a delicadeza, como um cancro maligno no organismo até então saudável, ou cai do azul de chofre, derrubando qualquer um que lhe tente deter.
A vida é feita de uma sucessão de medos, anseios, autocobranças, satisfações que achamos que devemos ao universo — quando o universo não tem a mínima ideia de quem somos, não faz o menor esforço para entender nossas necessidades as mais íntimas, não partilha de nossos desassossegos quanto ao que nos prepara o mundo e sua sedutora crueldade, e não tem nenhuma pretensão de fazê-lo —, dilemas existenciais que vêm e vão ao sabor das obsessões mais vultosas do momento, tantos deles profundos como um balde, e dúvidas quanto ao que reserva-nos o futuro, essas a fonte do alvoroço essencial que é viver. A sensação de desajuste, de estar sempre colocando-se em situações incômodas, sobre as quais não temos qualquer ascendência, perigosas até, muitas vezes — e, pior, de propósito, ainda que nosso inconsciente nunca o queira confessar —, vai tornando-se mais abafada ao longo dos anos, mais difusa, até que nos socorre uma salvífica maturidade, de que, finalmente estamos autorizados a dispor nos momentos de inescapável apertura.
Benj, Connor e Eddie não querem desperdiçar nem um segundo e começam tentando se enturmar, inclusive entre os garotos mais velhos. Connor, apelidado por eles de Feto, conduz os outros dois por farras em casas suspeitas, até que Benj pode, afinal, organizar sua própria festa, enquanto os pais estão viajando. Mason Thames, Raphael Alejandro e Ramon Reed têm o carisma de veteranos como Bobby Cannavale, naa pele do senhor Studebaker, um professor de ciências aloprado como o clichê manda. O humor nonsense e ingênuo de “Os Novatos” leva-nos de volta ao tempo em que pensávamos que seríamos novas lendas, sem cetamina, mas com substâncias igualmente tóxicas.
Filme: Os Novatos
Direção: Dave e John Chermin
Ano: 2024
Gêneros: Comédia/Coming-of-age
Nota: 8/10