Na Netflix: 6 histórias de amor reais que vão tocar profundamente seu coração Divulgação / Netflix

Na Netflix: 6 histórias de amor reais que vão tocar profundamente seu coração

O que o amor tem para nos enfeitiçar tanto? Passam-se os anos, os séculos, as eras, e o ideal romântico segue como a grande aspiração de gente pobre, gente rica, nos palacetes, nos tugúrios, conduzindo a o processo civilizatório em tempos de barbárie, hipnotizando mesmo aqueles que, não sem motivo, há muito perderam a fé em Eros. Boa parte dos óbvios mistérios do mais humano dos sentimentos, o maravilhoso ridículo da vida, são desvendados em “Meu Amor — Seis Histórias de Amor Verdadeiro”, série que acompanha o dia a dia de seis casais, cada qual com um episódio para chamar de seu. Produzida pela Netflix, “Meu Amor” começa em Vermont, nordeste dos Estados Unidos, e vai para Espanha, Japão, Coreia do Sul, Brasil e fecha na Índia, registrando uma convivência de pelo menos quatro décadas, sem nenhum receio de mostrar suas fraquezas e sua bravura, o que imprime às histórias a convicção de que a felicidade é uma tela em branco, que se colore da maneira como se acha melhor.

Os veteranos Ginger e David Isham abrem o documentário voltando a 1959, o ano em que o rapaz de Vermont casou-se com a moça de Bristol, Connecticut. Os dois aparecem sempre juntos, extraindo a seiva do bordo para fazer o xarope que sustenta o clã desde antes do casamento, e entender a dinâmica da vida no campo é fundamental para se ter uma ideia da harmonia que perpassa o casamento dos dois. Para o bem e para o mal, Ginger e David parecem ter sido feitos um para o outro e já terem chegado àquela fase em que ninguém mais sente necessidade de se dirigir ou a ele ou a ela em particular.

David reconhece que a esposa sempre falara pelos dois, mas agora o ancião ainda enérgico, porém cada vez mais dependente, resolvera que a hora é de ceder em tudo, quiçá o segredo de uma união assaz longeva. Datas comemorativas são um dos ganchos que facilitam a identificação do público com o enredo dos seis capítulos, e no caso deste, além do Quatro de Julho e do Ano-Novo, o sexagésimo aniversário de matrimônio dos Isham amplia o arco para conversas sobre cremação, a inutilidade dos funerais, herança, tudo da forma mais bem-humorada possível.

“Meu Amor” não perde de vista seu caráter plural e até politicamente correto ao retratar Kinuko e Haruhei, japoneses de Yokohama, nos arredores de Tóquio, a bela enfermeira que se apaixona por um paciente em tratamento da hanseníase também no final dos anos 1950, e Jurema e Eunice, a Nicinha, o único casal homoafetivo da seleção. Dirigido por Carolina Sá, a quinta parte do documentário ensaia comentários sutis acerca da dura rotina de duas empregadas domésticas que passaram a viver juntas quando uma delas tinha apenas catorze anos.

Nicinha, seis anos mais nova, parece confortável na pele de tutora da companheira, hoje aposentada, ajudando-a a vencer as escadarias inclementes da Rocinha, favela da Zona Sul carioca, levando a passeios em Engenheiro Pedreira, bairro de Japeri, na Baixada Fluminense, onde planejam adquirir um terreno e erguer uma casa. Enquanto não desfrutam das águas revoltas do rio Guandu, organizam cerimônias para Xangô e Oxum, os orixás de cada uma, cuidam dos netos, todos no mesmo lote, ignorando os olhares tortos quando saem juntas, de mãos dadas, por um Rio de Janeiro liberal para gringo ver. Mesmo para elas o amor é lindo como os fogos no céu na noite que marca o princípio de mais um ano, apreciados na laje de um casebre no alto do morro.


Série: Meu Amor — Seis Histórias de Amor Verdadeiro
Direção: Deepti Kakkar, Elaine McMillion Sheldon, Fahad Mustafa, Chico Pereira, Carolina Sá e Hikaru TodaAno: 2021
Gêneros: Documentário 
Nota: 9/10