No filme “A Escavação”, o verdadeiro foco é o confronto com o passado e suas implicações na vida dos personagens. Inspirado no romance “The Dig”, de John Preston, o diretor Simon Stone captura a essência melancólica e introspectiva de Edith Pretty, uma mulher cuja intuição a guia em uma busca que transcende o simples ato de desenterrar relíquias antigas.
Edith, interpretada com sutileza por Carey Mulligan, é uma figura complexa que enfrenta a solidão após a morte do marido, criando seu filho Robert sozinha. Sua vida, embora confortável em termos materiais, é marcada por um vazio profundo. É nesse contexto que surge sua convicção de que há algo significativo enterrado em sua propriedade, algo que talvez possa trazer um novo sentido à sua existência. Essa crença a leva a contratar Basil Brown, um arqueólogo autodidata que compartilha com Edith uma visão intuitiva do mundo, distanciando-se dos métodos tradicionais de pesquisa arqueológica.
Basil, que já havia demonstrado interesse na propriedade de Edith, aceita o desafio de explorar o terreno em busca de vestígios de civilizações antigas. A narrativa do filme se desenrola a partir da descoberta de três túmulos, que rapidamente evolui para algo muito mais grandioso: a revelação de um navio-fantasma enterrado, possivelmente pertencente ao rei Raedwald, uma figura histórica associada ao início do cristianismo na Inglaterra. Raedwald, conhecido como o “Tutancâmon britânico”, é uma figura envolta em mistério, cuja transição do paganismo para o cristianismo simboliza a complexidade da identidade cultural da época.
O filme explora as profundezas emocionais de seus personagens à medida que eles se envolvem com as escavações. Edith, ainda lidando com a dor da perda, enfrenta uma doença terminal que a consome lentamente. Sua crença de que sua condição pode estar relacionada à tristeza profunda que sente pela morte do marido revela uma introspecção sombria sobre a interseção entre mente e corpo. A ideia de que sua doença é uma manifestação física de sua dor emocional é uma reflexão sobre como o luto pode impactar profundamente a saúde de uma pessoa.
Enquanto isso, Basil, apesar de suas contribuições significativas para a descoberta, é subestimado devido à falta de credenciais acadêmicas. Sua dedicação ao trabalho é inegável, mas ele se vê forçado a deixar as escavações, um reflexo das injustiças e preconceitos que permeiam a sociedade. A conexão entre Edith e Basil vai além da escavação; ambos estão em uma busca desesperada por propósito e aceitação em um mundo que frequentemente marginaliza aqueles que não se encaixam nos moldes convencionais.
“A Escavação”, na Netflix, não oferece respostas fáceis sobre a morte ou o luto. Em vez disso, propõe uma reflexão sobre como os seres humanos enfrentam a mortalidade e o legado que deixam para trás. A história sugere que, embora ninguém possa escapar da morte, é possível encontrar significado na forma como se vive, na busca por compreender o passado e em como se escolhe enfrentar os desafios da vida. A jornada de Edith e Basil, marcada por perdas e descobertas, é um lembrete poderoso de que a vida, apesar de todas as suas dificuldades, sempre contém a possibilidade de novas revelações e entendimentos.
Filme: A Escavação
Direção: Simon Stone
Ano: 2021
Gênero: Drama
Nota: 9/10