A descoberta de novas experiências e perspectivas é um processo contínuo e enriquecedor, que se torna ainda mais valioso quando iniciado cedo. Mesmo em meio a indivíduos resistentes às mudanças inevitáveis da sociedade moderna, a evolução é incontestável. E, com essa transformação, o cinema também avança, seja por motivos artísticos ou pela necessidade de evitar fracassos comerciais.
Em 2017, o Oscar já demonstrava sinais de mudança ao reconhecer a importância artística e social de filmes como “Moonlight” (2016), dirigido por Barry Jenkins. A história, centrada em personagens marginalizados pela sociedade – negros, pobres e homossexuais – retrata a luta desses indivíduos em aceitar e viver um amor que eles mesmos acreditavam ser impossível. Apesar de todo o contexto favorável, as barreiras internas e externas tornavam a relação quase inviável. No entanto, a urgência de dar voz a essas narrativas era evidente e não poderia ser ignorada por Hollywood. O resultado foi a vitória de “Moonlight” em três categorias do Oscar, incluindo a de Melhor Filme.
A narrativa de “Moonlight” não foi um caso isolado. Em “Me Chame Pelo Seu Nome”, o diretor Luca Guadagnino apresenta outra história de descoberta, desta vez ambientada na Itália, durante um verão na década de 1980. A trama gira em torno de Elio, um jovem que se encontra dividido entre o que sente e o que acredita ser esperado dele. O despertar de sua sexualidade é desencadeado pela chegada de Oliver, um estudante convidado por seu pai, o professor Perlman, para auxiliá-lo em uma pesquisa. A atração de Elio por Oliver é instantânea e avassaladora, desafiando suas próprias noções de identidade e desejo.
Embora o filme tenha sido amplamente aclamado, não escapou de críticas por parte de alguns que consideraram a relação entre Elio e Oliver inadequada devido à diferença de idade. No entanto, essa interpretação ignora a profundidade com que o filme aborda temas como autoconhecimento, aceitação e liberdade. O professor Perlman, uma figura de grande sensibilidade e discernimento, é retratado como alguém que já compreende a complexidade dos sentimentos de seu filho e apoia seu processo de descoberta.
A ambientação do filme nos anos 1980 não é apenas um pano de fundo, mas também um reflexo das atitudes da época em relação à sexualidade. Esse período, ainda influenciado pelos resquícios das revoluções culturais das décadas anteriores, proporcionava uma liberdade que seria rapidamente contestada pelos conservadorismos que se seguiram. James Ivory, que adaptou o roteiro do filme, captura essa tensão entre a libertação e a repressão, sem deixar de lado a humanidade dos personagens.
Em “Me Chame Pelo Seu Nome”, na Netflix, o crescimento de Elio é o ponto central, e sua jornada é tratada com uma sutileza rara em filmes que abordam temas similares. A produção evita rótulos simplistas, preferindo explorar a complexidade das relações humanas sem julgamentos ou estigmatizações. A narrativa, rica em detalhes visuais e emocionais, transporta o espectador para um espaço onde a beleza e a intelectualidade coexistem de forma natural e sem pretensões.
Embora a trama se desenrole em um período passado, os temas abordados continuam relevantes. A relação entre Elio e Oliver, mesmo que não resulte em um final convencional, deixa marcas profundas em ambos, refletindo as mudanças que o tempo e as circunstâncias trazem às nossas vidas. A sociedade de hoje, menos de quatro décadas depois, é uma sombra do que já foi, marcada por transformações que moldaram nossa visão de mundo e de nós mesmos.
Este filme, assim como “Moonlight”, faz parte de um movimento maior dentro do cinema que busca dar voz a histórias que desafiam as normas estabelecidas e celebram a diversidade de experiências humanas. Ambos os filmes, cada um à sua maneira, representam um avanço na forma como a sétima arte lida com temas complexos e muitas vezes marginalizados, contribuindo para um diálogo mais inclusivo e empático.
Filme: Me Chame Pelo seu Nome
Direção: Luca Guadagnino
Ano: 2017
Gênero: Romance/Drama
Nota: 9/10