Adaptação de livro com mais de 500 mil cópias vendidas, romance com Jane Fonda e Robert Redford está na Netflix Kerry Brown / Netflix

Adaptação de livro com mais de 500 mil cópias vendidas, romance com Jane Fonda e Robert Redford está na Netflix

O ser humano, com seus dilemas e inquietações, é indiscutivelmente uma das formas de vida mais complexas e, talvez, mais aflitas. No instante em que a felicidade parece estar ao alcance, conseguimos, muitas vezes, criar novas barreiras, condicionando nossa alegria à permissão ou à presença de outrem. Com o passar do tempo, é possível perceber que a vida seguiu seu curso quase sem ser notada, transformando décadas em um simples piscar de olhos. Essa pode ser uma das tragédias inevitáveis da existência humana.

“Nossas Noites” não se define de imediato sobre seu propósito ou sobre a direção que pretende tomar. A trama se aventura silenciosamente nas profundezas das mentes de dois indivíduos marcados pelo tempo e seus efeitos inexoráveis, tanto mentais quanto físicos. Embora o filme inicialmente sugira uma inclinação para o noir, logo revela que não é esse o seu verdadeiro foco. Afinal, seria possível classificar como noir uma história em que Jane Fonda convida Robert Redford a passar a noite em sua casa apenas para dormir, sem qualquer insinuação de segundas intenções? A partir desse ponto, o longa de Ritesh Batra, de 2017, se torna menos misterioso, embora continue a surpreender de maneira sutil. A arte da surpresa é algo que esses profissionais dominam com maestria há muito tempo.

Jane Fonda e Robert Redford, duas lendas do cinema clássico, têm uma longa história compartilhada nas telonas. Ao longo de suas carreiras, estrelaram inúmeros filmes icônicos, conquistaram prêmios importantes e se destacaram tanto individualmente quanto como dupla. A química entre eles, que encantou o público no passado, permanece evidente em “Nossas Noites”. Mais de cinco décadas atrás, eles deram vida ao jovem casal Corie e Paul em “Descalços no Parque” (1967), uma comédia romântica onde expressaram de forma desinibida a leveza e a alegria de viver. Agora, já maduros e com a experiência dos anos, Fonda e Redford interpretam Addie Moore e Louis Waters, dois vizinhos viúvos em uma pequena cidade do Colorado. Eles enfrentam a solidão de maneiras distintas, mas ambos demonstram que ainda têm muito a oferecer.

A direção de Batra, baseada no romance do renomado escritor americano Kent Haruf (1943-2014) e adaptada por Scott Neustadter e Michael H. Weber, resulta em um filme leve, mas introspectivo. A trilha sonora de Elliot Goldenthal, com seu banjo suave e a inclusão de clássicos dos “Highwaymen”, juntamente com a fotografia de Stephen Goldblatt, que equilibra luz e sombra, conferem à obra uma aura de inocência reminiscente dos tempos em que Fonda e Redford iniciaram suas carreiras. Embora o romance entre os protagonistas idosos não desperte grandes emoções, ele atrai a curiosidade do público, que deseja saber onde essa relação peculiar irá parar. Para muitos, é inevitável rememorar os personagens de “Descalços no Parque”, especialmente ao observar a liberdade com que Addie, interpretada por Fonda, conduz a situação. Louis, por sua vez, retratado por Redford como um homem tradicional e reservado, aceita a proposta de Addie, mas encara a relação com uma leveza que beira o descompromisso.

A dinâmica entre os dois é observada com atenção pelos demais moradores da cidade, incluindo Dorian, interpretado por Bruce Dern, que, em tom de brincadeira, não esconde uma ponta de inveja. A relação entre Addie e Louis acaba se consolidando; Addie supera sua insônia, e a vida segue seu curso, ainda que assombrada, ocasionalmente, por sombras do passado, personificadas pelos filhos dos protagonistas, interpretados por Judy Greer e Matthias Schoenaerts. Mesmo que essa nova fase da vida seja desafiada por circunstâncias externas, algo profundo se altera em ambos. Tal como Fonda e Redford, Addie e Louis não sentem a necessidade de provar mais nada a ninguém, e continuam a viver suas vidas da forma mais plena possível. O final melancólico de “Nossas Noites”, na Netflix, sugere, e nos faz torcer, que um dia eles voltarão a dividir o mesmo espaço.


Filme: Nossas Noites
Direção: Ritesh Batra
Ano: 2017
Gêneros: Romance/Drama
Nota: 9/10